Os procuradores que se debruçaram sobre os esquemas de corrupção do ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (PMDB) disseram nesta terça-feira que não é possível vislumbrar um final para as investigações envolvendo o peemedebista. Cabral, preso desde o final do ano passado, já foi denunciado quatorze vezes pelo Ministério Público Federal (MPF).
“Sem dúvidas [o volume de propina] pode ser maior. Desde a Operação Calicute [que prendeu o ex-governador, em novembro], avançamos muito na definição da extensão do dano causado pela organização criminosa chefiada por Sergio Cabral. Mas, de fato, fica difícil imaginar o final ainda. Basta ver no organograma da administração pública quantas secretarias tem”, afirmou o procurador Leonardo Freitas.
Ao apresentarem duas novas denúncias contra o ex-governador e o ex-presidente do Departamento de Transportes do Estado (Detro) Rogério Onofre, os procuradores declararam ter descoberto a propina mais vultosa recebida individualmente por Cabral até agora. São 144,8 milhões de reais, pagos em 197 repasses feitos por empresas de transportes de passageiros que atuaram no Rio entre 2010 e 2016.
Os valores foram encontrados em uma “contabilidade incontestável”, segundo o MPF. O esquema desvelado também incluiu os setores de obras e da saúde. Cabral e Onofre foram acusados por corrupção, lavagem de dinheiro, crime contra o sistema financeiro e organização criminosa. “Nos contratos de obras públicas a regra era de 5% [do valor das obras para Cabral], e pode haver propinas maiores do que essa que estamos imputando hoje”, afirmou o procurador da República José Augusto Vagos.
Cabral recebia também um “bônus” quando tomava medidas consideradas muito importantes pelos empresários de ônibus: em janeiro de 2014, a redução de 50% do IPVA dos coletivos lhe rendeu 13 milhões de reais. “É importante que fique claro que essa propina [a Cabral] era mensal, às vezes, até quinzenal, independentemente de época de eleição, e que ele continuou a receber após o fim do mandato [em 2014]. Em época de campanha havia aportes diferenciados”, disse Vagos.
Os procuradores apontaram nas duas novas denúncias a atuação da Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado (Fetranspor), que reúne sindicatos, no esquema. Eles levantaram provas de que a uma “caixinha de propina” foram destinados repasses de 26 empresas de ônibus, num total de 250 milhões de reais, a agentes públicos e políticos entre 2013 e 2016.
A operação
As acusações, que partiram da Operação Ponto Final, desdobramento da Operação Lava Jato, foram protocoladas na segunda-feira, na 7ª Vara Federal Criminal do Rio. Os procuradores detalharam o seu conteúdo na manhã desta terça. Eles pediram o bloqueio de pelo menos 520 milhões de reais de membros da organização para reparação dos danos causados ao erário. A propina era lavada e enviada ao exterior, segundo o MPF.
Outros 23 investigados na Ponto Final foram denunciados, entre empresários de ônibus e servidores do estado. Cabral teria recebido propina pelo menos entre julho de 2010 a outubro de 2016. No mesmo período, Rogério Onofre ficou com 43,4 milhões de reais, segundo o MPF. O ex-presidente da Detro também está preso.
Os pagamentos ilícitos garantiam a liderança de empresários nos transportes no Rio, além de benefícios na política tarifária e benesses tributárias. As denúncias citam o aumento de 7% das passagens de ônibus intermunicipais em dezembro de 2009, por decisão de Cabral e de Onofre, como contrapartida do estado às contribuições para a “caixinha”.
As informações foram levantadas graças às colaborações premiadas do doleiro Álvaro Novis e do ex-presidente do Tribunal de Contas do Estado Jonas Lopes, alvos de operações anteriores da PF, e ainda com a quebra do sigilo telefônico e de e-mails dos envolvidos e material arrecadado em buscas da polícia.
(Com Estadão Conteúdo)