Os partidos políticos brasileiros fazem uma espécie de “limpa” em seus quadros, com expulsões de centenas e até milhares de filiados, de tempos em tempos. Diferentemente do que se pode pensar, essas ondas de expulsão nada têm a ver com escândalos de corrupção ou investigações criminais. Similares em todas as legendas, o que as explica é algo mais prosaico: disputas locais pelo controle da máquina partidária em anos próximos a eleições municipais.
Do total de expulsões, só 1% (541) pertence à elite política que conquistou mandatos para cargos municipais, estaduais ou mesmo federais. O levantamento não encontrou nenhum senador, governador ou presidente da República, mas foram localizados 471 vereadores, 59 prefeitos e 11 deputados estaduais que sofreram a mais alta sanção dos partidos pelos quais foram eleitos.
Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostram que todos os partidos existentes e extintos fizeram 64 mil operações de expulsão desde 2007. Três em cada quatro dessas expulsões ocorreram em períodos perto de disputas locais – ou no ano da eleição ou no anterior. Em legendas como PMDB, PSDB, DEM, PR, PP e PSB, mais da metade das expulsões registradas em uma década se concentrou em 2015 e 2016. Logo atrás, estão PT, PDT e PTB, que tiveram entre 40% e 49% das suas expulsões nesse período.
O professor de Ciência Política da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP) Claudio Couto avalia que é natural que os ciclos acompanhem as disputas municipais. “Primeiro, porque há mais peixes pequenos do que peixes grandes. Os maiores embates acontecem localmente, é onde começam a se formar as lideranças importantes”, disse. “Segundo, é mais fácil expulsar peixe pequeno do que peixe grande, porque este tem aliado.”
Elite
Desde o começo da Operação Lava Jato, os ditos “peixes grandes” ficaram mais em evidência. As listas dos ministros Teori Zavascki, morto neste ano, e Edson Fachin, relatores da força-tarefa, autorizaram a investigação de 49 e 63 parlamentares, respectivamente.
Também pela Lava Jato, encontram-se presos o ex-ministro Geddel Vieira Lima (PMDB-BA) e o deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Enquanto eles continuam no PMDB, em 2013, um pedido de prisão expedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) levou à expulsão de Natan Donadon. Ele foi condenado a 13 anos em regime fechado pelos crimes de peculato e formação de quadrilha, acusado de desviar recursos da Assembleia Legislativa de Rondônia, quando a presidiu entre 1995 e 1999. Apesar de poupar grandes lideranças, a sigla que mais expulsou foi o próprio PMDB, com 8.350.
Em Brasília, a lógica de excluídos por brigas internas ou infidelidade partidária se sobrepõe a de escândalos. Em novembro do ano passado, o PR desligou Clarissa Garotinho – única parlamentar expulsa nos últimos dez anos – por votar contra a PEC do Teto dos Gastos. Outros três deputados também foram punidos por infidelidade: Rafael Motta (RN), Valtenir Pereira (MT) e Domingos Neto (CE) criticaram o uso do Fundo Partidário pelo Diretório Nacional do PROS e foram expulsos.
Proporcionalmente, o PSB foi o que mais expulsou, atingindo, em 2016, uma taxa de 171 a cada 100 mil filiados. “Em ano eleitoral, você sempre tem disputas com infidelidade, um candidato que comete um ato em discordância com a direção”, diz o secretário nacional, Roberto Casagrande. Apesar de ver com “estranheza” os números do TSE, assim como outras legendas maiores, o PSB não contabiliza os excluídos de seus quadros.
Todos os partidos têm código de ética genérico que tratam de irregularidades. No PT, em 2015, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse em um programa de TV que a legenda expulsaria quem fosse condenado. Após dois anos, os ex-ministros José Dirceu, Antonio Palocci e o próprio Lula foram condenados. Nenhum deles integra os 5.359 expulsos desde 2007.
Palocci, após criticar Lula, colocou sua desfiliação à disposição. Como o caso ainda está na Direção Nacional, oficialmente ele é filiado. “Nos casos de improbidade, o critério que o partido adota é o da democracia: o respeito ao direito de defesa e a exigência do trânsito em julgado das condenações”, diz Gleide Andrade, secretária nacional de organização do PT.
Alguns partidos questionam os dados do TSE. O Novo não confirmou as sete expulsões registradas em seus dois anos de existência. Conforme o dirigente André Strauss, os casos apresentados como expulsões se tratam de desfiliações. O tribunal computa ao PSTU 69 expulsões desde 2007. O presidente da sigla, Zé Maria, disse não se lembrar de ter excluído filiados. “Não expulsamos ninguém por divergência política. Expulsamos só por falha moral.”
(Com Estadão Conteúdo)