Nesta quarta-feira, 20 anos após as denúncias formais, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) começa a julgar o Brasil por violações contra quilombolas relacionadas à Base de Alcântara, centro de lançamento aeroespacial construído no Maranhão na década de 80. Está é a primeira vez na história que o país é colocado no banco dos réu em uma corte internacional. As audiências ocorrem hoje e amanhã no Chile, quando serão ouvidos representantes do Estado brasileiro, vítimas, peritos e testemunhas.
O caso se arrasta no tribunal internacional desde 2001, quando representantes de movimentos quilombolas, junto com sindicalistas e a Defensoria Pública da União (DPU) enviaram à CIDH uma série de denúncias relacionadas à desapropriação e remoção compulsória das comunidades para a construção do Centro de Lançamento de Alcântara, MA, a cerca de 100 km de São Luís. Os denunciantes afirmam que a obra foi imposta aos moradores dos quilombos, que somavam 312 famílias em 32 povoados, e exigem indenizações por prejuízos ao acesso dos habitantes à cultura, alimentação, educação, saúde e livre circulação. Mais além, os quilombolas não receberam os títulos de propriedade das terras onde foram realocados, embora o território tenha sido certificado pela Fundação Palmares em 2004 e identificado pelo Incra em 2008.
Na esteira do início do julgamento, o governo federal decretou nesta quarta-feira a criação de um grupo de trabalho interministerial para avaliar a titulação das terras quilombolas e propôr uma resolução que contemple as vítimas sem prejudicar a operação da Base de Alcântara – que, inclusive, pode ser usada pelos Estados Unidos para lançamento de foguetes por meio de acordo firmado em 2019. Criada por decreto do presidente da República em exercício, Geraldo Alckmin, e do ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, a comissão inclui integrantes de 12 órgãos federais, da Aeronáutica e de comunidades quilombolas e terá o prazo de um ano para apresentar um relatório final sobre o caso.