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Bolsonaro vira o candidato do antipetismo e vai ao 2º turno como favorito

Militar reformado com 27 anos de vida parlamentar e dois projetos aprovados desbanca PSDB na polarização com o PT e enfrenta Haddad na disputa pelo Planalto

Por Estêvão Bertoni Atualizado em 8 out 2018, 10h08 - Publicado em 8 out 2018, 09h25
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  • Aos 63 anos de idade, Jair Messias Bolsonaro, capitão da reserva e deputado federal com quase trinta anos de vida parlamentar que se consolidou após a derrocada do lulismo como o candidato da direita à Presidência da República devido ao seu antipetismo ferrenho e pelo discurso conservador, disputa o segundo turno das eleições de 2018, em 28 de outubro, contra Fernando Haddad (PT), após ter recebido 49 milhões de votos — ou 46% dos votos válidos — neste domingo (7).

    Filho do dentista prático Percy Geraldo Bolsonaro e da dona de casa Olinda Bonturi Bolsonaro, é o terceiro de seis irmãos. Nasceu em Campinas (SP), em 21 de março de 1955, mas foi criado na cidade de Eldorado, a 243 km de São Paulo. Na cidade em onde cresceu, teve seu primeiro contato com o Exército no início da juventude, quando soldados passaram pela região numa busca frustrada pelo guerrilheiro Carlos Lamarca — Bolsonaro diz ter ajudado a guiar os militares pelas matas locais, as quais conhecia desde a infância. Lamarca seria morto anos depois, em 1971, numa emboscada na Bahia.

    Naquela mesma década de 70, ele deixou o interior paulista para ingressar na Escola Preparatória de Cadetes do Exército, no Rio. Formou-se em 1977 na Academia Militar das Agulhas Negras, em Resende. Integrante da Brigada Pára-Quedista, tornou-se mestre em saltos em 1983. Também estudou educação física na Escola do Exército. Entre 1979 e 1981, serviu na cidade de Nioque, no Mato Grosso do Sul. Chegou à patente de capitão, posição intermediária no Exército.

    Em 3 de setembro de 1986, deixou transparecer sua verve política ao publicar em VEJA um artigo intitulado “O salário está baixo”, sobre a evasão na Academia Militar das Agulhas Negras causada, segundo ele, pela “situação crítica” dos vencimentos e pelas “perdas salariais” dos militares.

    “Não pleiteio aumento salarial. Reclamo –como fariam, se pudessem, meus colegas– um vencimento digno da confiança que meus superiores depositam em mim”, escreveu. “Não consigo sonhar com as necessidades mínimas que uma pessoa do meu nível cultural e social poderia almejar”, dizia no texto.

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    Por causa do artigo, foi preso por 15 dias por “transgressão grave” sob acusação de ter “ferido a ética, gerando clima de inquietação no âmbito da organização militar” e “por ter sido indiscreto na abordagem de assuntos de caráter oficial”.

    No ano seguinte, VEJA publicou uma reportagem afirmando que Bolsonaro e outro colega militar planejaram a explosão de bombas-relógio em unidades militares do Rio para pressionar seus superiores. Ele negou o plano e acabou absolvido em 1988, em julgamento militar (por 8 votos a 4) porque as perícias realizadas durante a investigação mostraram-se contraditórias, o que não permitia uma conclusão sobre o caso.

    No mesmo ano de sua absolvição, Bolsonaro foi para a reserva remunerada do Exército, após ter sido eleito vereador no Rio de Janeiro.

    Carreira política

    Ao longo de sua carreira política, passou por oito partidos: PDC (1989-1993), PP (1993), PPR (1993-1995), PPB (1995-2003), PTB (2003-2005), PFL (2005), PP (2005-2016), PSC (2016-2018) e PSL, pelo qual concorre à Presidência.

    Como vereador, Bolsonaro não ficou até o fim do período para o qual foi eleito. Deixou o cargo para assumir, em 1991, o primeiro de sete mandatos como deputado federal. Em 27 anos no Congresso, aprovou apenas dois projetos — de 162 apresentados. O primeiro, de 1996, prorrogava benefícios fiscais aos setores de informática e automação. O segundo, apresentado em 2016 ao lado de outros 17 deputados, entre os quais o filho Eduardo Bolsonaro, autorizava o uso da fosfoetanolamina sintética por pacientes com câncer. Conhecida como “pílula do câncer”, a substância nunca teve sua eficácia comprovada cientificamente.

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    Ele começou a se credenciar como presidenciável em meio à crise do governo Dilma Rousseff. Seu discurso antipetista e conservador nos costumes, com tons machistas, homofóbicos e racistas, ia ao encontro dos anseios da direita. Dilma foi afastada do cargo em 2016, depois de sofrer um processo de impeachment por causa de “pedaladas fiscais”.

    Em seu discurso pela cassação da petista, Bolsonaro parabenizou o então presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (MDB), e dedicou o voto à “memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff”. Chefe dos órgãos de repressão da ditadura militar, Ustra (1932-2015) chegou a ser condenado em 2008, em primeira instância, por sequestro e tortura.

    Polêmicas

    Ao longo dos últimos anos, Bolsonaro foi questionado por uma série de declarações sobre mulheres, negros e homossexuais.

    Em 2003, começou a se desentender com a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) após ela acusá-lo de incentivar a violência sexual. Durante um bate-boca, o deputado chamou a colega de “vagabunda” diante das câmeras da RedeTV!.

    Em 2014, após a deputada classificar a ditadura militar no Brasil como “vergonha absoluta” durante um pronunciamento, Bolsonaro passou a fazer ataques à parlamentar. Em plenário, disse que não a estupraria porque ela não merecia. Depois, numa entrevista ao jornal “Zero Hora”, reafirmou a declaração dizendo que “ela não merece porque ela é muito ruim, porque ela é muito feia, não faz meu gênero, jamais a estupraria”. “Eu não sou estuprador, mas, se fosse, não iria estuprar, porque não merece”, afirmou.

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    Em 2015, foi condenado na Justiça do Distrito Federal a pagar indenização de 10 mil reais à petista por danos morais. Ele recorreu. No ano seguinte, o STJ confirmou a condenação e determinou que o deputado deveria se retratar publicamente. Em 2016, ele virou réu no STF (Supremo Tribunal Federal) por incitação ao crime de estupro e injúria.

    Em relação aos negros, Bolsonaro também respondeu a um processo no Supremo por ter dito, em 2017, durante palestra no Clube Hebraica, no Rio, ter visitado um quilombo onde “o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas” (unidade de medida de animais). “Não fazem nada. Eu acho que nem para procriador ele serve mais. Mais de R$ 1 bilhão por ano é gasto com eles”, disse. Em setembro deste ano, o STF rejeitou a denúncia por racismo, por 3 votos a 2, e o absolveu do crime.

    O deputado também fez, com frequência, comentários homofóbicos. Em 2011, numa entrevista à Playboy, afirmou: “Seria incapaz de amar um filho homossexual. Não vou dar uma de hipócrita aqui: prefiro que um filho meu morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí. Para mim ele vai ter morrido mesmo”. Em outra entrevista à televisão, o deputado afirma que se “o filho começa a ficar assim meio gayzinho, leva um ‘couro’, ele muda o comportamento”.

    Discurso anticorrupção

    Bolsonaro se orgulha de dizer em entrevistas ser um dos poucos políticos não envolvidos na Operação Lava Jato, embora tenha feito parte, por onze anos, do PP, uma das siglas com mais investigados nos escândalos envolvendo a Petrobras. Seu plano de governo afirma que o “problema é o legado do PT de ineficiência e corrupção” e diz que irá sufocá-la resgatando “As Dez Medidas Contra a Corrupção”, proposta pelo Ministério Público Federal, “e encaminhá-las para aprovação no Congresso Nacional”.

    Apesar de seu discurso, o candidato já foi questionado por ter, em 2007, empregado a mulher, Michelle de Paula Firmo Reinaldo Bolsonaro, por um ano e dois meses em seu gabinete, com o maior cargo. Ela foi exonerada em 2008, após o STF entender que a Constituição proibia o nepotismo na administração pública. Bolsonaro também recebia auxílio-moradia mesmo tendo imóvel em Brasília.

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    O deputado também empregou como funcionária de seu gabinete em Brasília, desde 2003, uma vendedora de açaí de Angra dos Reis que prestava serviços particulares em sua casa no litoral fluminense. Ele acabou demitindo a funcionária em agosto deste ano, após o caso ser citado em debate pelo candidato Guilherme Boulos (PSOL). Bolsonaro negou irregularidades e afirmou que a imprensa tentava torná-lo um criminoso.

    Em outubro deste ano, VEJA publicou detalhes de um processo de 2008 em que Bolsonaro e Ana Cristina Siqueira Valle, sua segunda mulher com quem foi casado por dez anos, disputavam a guarda do filho que tiveram. Nos autos, há informações de que o deputado ocultou patrimônio pessoal da Justiça Eleitoral em 2006. Ele declarou ter 433.934 reais em bens, mas a declaração de imposto de renda anexada por Ana Cristina revelava que o patrimônio do casal somava 7,8 milhões de reais.

    Ana Cristina também acusava o ex-marido de furtar 1,6 milhão de reais em joias e dinheiro de um cofre que ela mantinha no Banco do Brasil, para chantageá-la. Ela também classificava o deputado como uma pessoa de “comportamento explosivo” e de “desmedida agressividade”. Hoje, ela nega as acusações e diz que, na época do litígio, falou “besteiras” por ter ficado “brava”.

    Bolsonaro tem cinco filhos, de três casamentos. Flávio, deputado estadual no Rio, Carlos, vereador também no Rio, e Eduardo, deputado federal por São Paulo, são filhos da primeira mulher, Rogéria Nantes Nunes Braga. Com Ana Cristina, ele teve o filho Renan. Já com Michelle, teve Laura.

    Economia

    Embora admita não entender nada de economia, Bolsonaro se classifica como liberal. Por isso, anunciou ter um ministro da Fazenda antes mesmo das eleições. Escolheu para a função Paulo Guedes, a quem chama de seu “posto Ipiranga”, em referência à propaganda em que um personagem responde a todos os pedidos de informação que lhe são feitos.

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    Guedes, que é PhD em economia pela Universidade de Chicago, foi um dos fundadores do Banco Pactual. Parte do mercado passou a apoiar a candidatura de Bolsonaro após a escolha, embora Geraldo Alckmin, por ser discurso reformista, tenha sido considerado o favorito.

    Favorável às privatizações irrestritas para pagar parte da dívida pública, Guedes também defende o teto de gastos para as despesas públicas aprovado pelo presidente Michel Temer (MDB).

    Em setembro deste ano, algumas propostas que tinham sido apresentadas pelo economista em palestra fechada vazaram na imprensa e causaram dor de cabeça para o candidato. Guedes propôs a criação de um imposto semelhante à antiga CPMF (sobre movimentações bancárias) e uma alíquota única de 20% do Imposto de Renda para pessoas físicas e jurídicas. Bolsonaro correu ao Twitter para amenizar a polêmica. “Nossa equipe econômica trabalha para redução de carga tributária, desburocratização e desregulamentações. Chega de impostos é o nosso lema!”, escreveu.

    Propostas

    Em seu programa de governo, Bolsonaro defende a redução do número de ministérios, a desburocratização e a descentralização do governo.

    Em relação à segurança pública, promete acabar com a progressão das penal e com as saídas temporárias dos presos, quer aprovar a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, reformular o Estatuto de Desarmamento para facilitar o acesso às armas (para ele, “o cidadão armado é a primeira linha de defesa”) e tipificar como terrorismo as ocupações de propriedades rurais e urbanas.

    Propõe ainda a criação de um Prontuário Eletrônico Nacional Interligado, contendo as informações dos pacientes e um Credenciamento Universal dos Médicos, para que “toda a força de trabalho da saúde possa ser utilizada pelo SUS (Sistema Único de Saúde)” e atuar em todos os planos de saúde. Em seu governo, o programa Mais Médicos será extinto e substituído pelo programa Médicos de Estado, para “atender áreas remotas e carentes do Brasil”.

    Ele também quer criar escolas militares nas capitais e defende o “Escola Sem Partido”, que visa proibir qualquer discussão sobre a questão de gênero em salas de aula.

    Campanha

    Concorrendo pelo nanico PSL, Bolsonaro teve apenas oito segundos de TV — enquanto Geraldo Alckmin possuía cinco minutos. Isso não foi uma problema para ele. Segundo pesquisa Datafolha, 61% de seus eleitores se informavam pelo WhatsApp, aplicativo de troca de mensagens em que impossível controlar o conteúdo do que se circula. O PT chegou a atribuir seu crescimento no final da campanha às “fake news” (notícias falsas) espalhadas pelo aplicativo.

    O candidato também teve muito tempo de exposição na TV devido ao atentado que sofreu em Juiz de Fora (MG). Em 6 de setembro, ele foi esfaqueado na barriga por um homem que planejou o ataque por conta própria, segundo a Polícia Federal, motivado por inconformismo político. Ele passou por duas cirurgias. Seus boletins médicos eram noticiados diariamente. Transferido para o Hospital Albert Einstein, em São Paulo, em 7 de setembro, ele recebeu alta em 29 de setembro.

    No mesmo dia em que deixou o hospital e foi para casa, no Rio, o capitão da reserva viu serem organizadas manifestações por mulheres nos 26 estados e no Distrito Federal. Os atos, simbolizados pela hashtag #EleNão, porém não impediram o avanço de Bolsonaro, que começou a subir nos levantamentos seguintes. Enquanto se recuperava, o deputado recebeu o apoio das bancadas ruralista e evangélica no Congresso Nacional.

    Frases

    1999
    “Eu sou favorável à tortura, tu sabe disso”

    1999
    “Deveriam ter sido fuzilados uns 30 mil corruptos, a começar pelo presidente Fernando Henrique Cardoso”

    2014
    “Eu não sou estuprador, mas, se fosse, não iria estuprar porque não merece”

    2016
    “O erro da ditadura foi torturar e não matar”

    2017
    “Foram quatro (filhos) homens. A quinta eu dei uma fraquejada e veio mulher”

    2017
    “Eu fui num quilombola [sic] em Eldorado Paulista. Olha, o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada! Eu acho que nem para procriador ele serve mais”

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