Trechos da entrevista de quase duas horas concedida com exclusividade a VEJA por Fabrício Queiroz, o amigo do clã presidencial denunciado como operador do esquema de rachadinha no gabinete do hoje senador Flávio Bolsonaro.
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Por que decidiu se candidatar agora? Virei um leproso e quero mudar isso aí. Minha filha chegou a ser nomeada para um cargo no Palácio Guanabara e em seguida a exoneraram. Claro que fiz um contato aqui e ali, mas ela é qualificada. Decidi então rasgar o véu e mostrar a cara.
Terá apoio da família Bolsonaro? Não sei, não tem pressão da minha parte. Mas já pensou? Fico pensando neles com as bandeiras do Queiroz: lealdade, fidelidade, pátria, Brasil, democracia e porrada na esquerda.
Como foi o encontro em Brasília com Flávio, em janeiro? Queria saber o que o Flávio achava da minha ideia de entrar para a política. Enquanto um interlocutor meu falava com ele, eu estava ali perto, tomando um chope. Ficarmos frente a frente poderia gerar fofoca. Ele concordou que eu deveria sair candidato. Adoraria ouvir da boca dele: “Vem para o PL”. Mas isso não veio.
Guarda mágoas do clã? Nenhuma. Não fui abandonado. Mas, se eu sou o presidente, pegaria o Queiroz e botaria do meu lado, entendeu? Teria me levado para Brasília, nem que fosse para cortar grama no Palácio. Quantos vagabundos há por aí, todos empregados? Por que tenho que passar por tudo isso?
Em meio ao escândalo da rachadinha, veio à tona que o senhor depositou 89 000 reais na conta da primeira-dama Michelle Bolsonaro. Qual foi a razão, afinal? Pedi três empréstimos para o Jair. Uma vez estava com 20 000 reais negativos no cheque especial, na outra foram 30 000 para comprar um Honda e depois mais 40 000 para um carro blindado. O Rio é muito perigoso.
Por que pôs dinheiro na conta de Michelle? Deputado não tem tempo. Não é melhor você dar a função para a tua mulher? Todo mês tem lá o chequinho.
O senhor operava a rachadinha, como afirma o MP fluminense? Que rachadinha? Qual é o problema de ter dinheiro na minha conta? Não estava na cueca, não. Sou um cara que faz rolo. Quem depositou na minha conta teve lucro, pelo menos um lucrozinho. Quanto às despesas do Flávio, é coisa normal. Até as minhas eu já pedi para alguém pagar no banco.
Por que o senhor se escondeu em Atibaia? Em dezembro de 2018, o capitão Adriano (da Nóbrega, miliciano que comandava o Escritório do Crime), que Deus o tenha, chega para mim e diz: “Tem gente querendo te matar”. Não revelou quem, mas essas pessoas sabem, entendeu? Aí procurei um advogado amigo que tinha relacionamento com o Fred Wassef (advogado do presidente) e falei: “Meu irmão, vê com o pessoal lá de cima o que está acontecendo. Vê lá porque vai cair na conta deles”. Aí fui para Atibaia, protegido pelo Wassef.
O MP retomou as investigações de um caso no qual o senhor e Adriano aparecem como suspeitos de um homicídio, quando eram policiais. O que aconteceu ali? O cara era bandido, vagabundo, estava de fuzil. Trocou tiro com a gente e quem morreu foi ele. Hoje está lá no inferno e eu, aqui. Chorou a mãe dele.
Quando o escândalo da rachadinha estourou, como foi sua conversa com Flávio? Estava todo mundo em cima e nos encontramos em um estacionamento de um supermercado na Barra da Tijuca. Eu o tranquilizei: “Esse negócio é meu, não tem nada a ver com vocês”.
E as transações imobiliárias de Flávio, que teriam sido feitas com recursos desviados do gabinete? Problema dele, imóveis não têm nada a ver comigo.
Ainda fala com o presidente? Não. Sou militar e obedeço. Desde 1984, a gente tinha uma afinidade legal, pô. Peguei os filhos dele no colo. Tudo novinho, loirinho, bonitinho.
Veja vídeo com trechos da entrevista:
Publicado em VEJA de 23 de março de 2022, edição nº 2781