O Supremo Tribunal Federal (STF) vai ter de explicar ao Tribunal de Contas da União (TCU) por que decidiu fazer uma licitação de 1,3 milhão de reais para comprar medalhões de lagosta e vinhos importados – e somente os premiados – para as refeições servidas pela Corte. Na ação, o subprocurador-geral do Ministério Público junto ao TCU, Lucas Rocha Furtado, afirmou que a notícia teve “forte e negativa repercussão popular”. Furtado também pediu a suspensão da licitação por meio de medida cautelar.
“E é de se reconhecer que essa repercussão não causa surpresa: os requintados itens que compõem as tais ‘refeições institucionais’, previstos no Pregão Eletrônico 27/2019, contrastam com a escassez e a simplicidade dos gêneros alimentícios acessíveis – ou nem isso – à grande parte da população brasileira que ainda sofre com a grave crise econômica que se abateu sobre o país há alguns anos”, declarou o subprocurador do TCU, em sua representação.
O MP pede “medidas necessárias a apurar a ocorrência de supostas irregularidades nos atos da administração do Supremo Tribunal Federal que visam à ‘contratação de empresa especializada para prestação de serviços de fornecimento de refeições institucionais, por demanda, incluindo alimentos e bebidas’.”
O senador Jorge Kajuru (PSB-GO) foi à tribuna do Senado para criticar a proposta e informou que entregou duas representações ao TCU, uma para suspender o contrato imediatamente e outra para fazer uma auditoria nos últimos dez contratos firmados pelo STF. “É um absurdo completo. Queremos saber cada detalhe desses contratos alimentícios, e dos contratos etílicos também”, afirma.
Na semana passada, o servidor público estadual Wagner de Jesus Ferreira, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG), também entrou com uma ação popular na Justiça Federal do Distrito Federal contra o pregão eletrônico do Supremo. A Corte havia dito que o edital seguiu padrão do Ministério das Relações Exteriores.
Menu de brunch a coquetel
O menu exigido pela licitação dos ministros dos STF inclui desde a oferta café da manhã, passando pelo “brunch”, almoço, jantar e coquetel. Na lista, estão produtos para pratos como bobó de camarão, camarão à baiana e “medalhões de lagosta”. As lagostas, destaca-se, devem ser servidas “com molho de manteiga queimada”.
A corte exige ainda que sejam colocados à mesa pratos como bacalhau à Gomes de Sá, frigideira de siri, moqueca (capixaba e baiana) e arroz de pato. O cardápio ainda traz vitela assada, codornas assadas, carré de cordeiro, medalhões de filé e “tournedos de filé”.
Os vinhos exigiram um capítulo à parte no edital. Se for tinto, tem de ser tannat ou assemblage, contendo esse tipo de uva, de safra igual ou posterior a 2010 e que “tenha ganhado pelo menos 4 (quatro) premiações internacionais”. “O vinho, em sua totalidade, deve ter sido envelhecido em barril de carvalho francês, americano ou ambos, de primeiro uso, por período mínimo de 12 (doze) meses.”
Se a uva for tipo Merlot, só serão aceitas as garrafas de safra igual ou posterior a 2011 e que tenha ganho pelo menos quatro premiações internacionais. Nesse caso, o vinho, “em sua totalidade, deve ter sido envelhecido em barril de carvalho, de primeiro uso, por período mínimo de 8 (oito) meses”. Para os vinhos brancos, “uva tipo Chardonnay, de safra igual ou posterior a 2013”, com no mínimo quatro premiações internacionais.
Em sua representação, o subprocurador-geral do Ministério Público junto ao TCU, Lucas Rocha Furtado afirma que a despesa “que se pretende realizar por meio daquela licitação encerra afronta ao princípio da moralidade administrativa” prevista na Constituição.
“Não se pode exigir, pois, dos administradores públicos, simplesmente o mero cumprimento da lei. De todos os administradores, sobretudo daqueles que ocupam os cargos mais altos na estrutura do Estado, deve-se exigir muito mais. Dos ocupantes dos altos cargos do Estado, deve-se exigir conduta impecável, ilibada, exemplar, inatacável. A violação da moralidade administrativa importa em ilegitimidade do ato administrativo e, sempre que for constatada essa violação, deve ser declarada, quer pela via judicial, quer pela via administrativa, a nulidade do ato ilegítimo”, sustenta Furtado.
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