Os dez anos do pontificado do papa Francisco, completados na segunda-feira 13 e marcados pelas orações do Angelus, a missa dos domingos no Vaticano, marcam um período de relevância histórica da Igreja Católica — sobretudo para uma instituição cujos movimentos são lentíssimos, atrelados a dogmas. O argentino Jorge Mario Bergoglio, de 86 anos, não pavimentou revoluções, e não é disso que se trata, mas provocou ruídos como havia muito não se via, talvez desde o Concílio Vaticano II, promovido por João XXIII nos anos 1960. O sumo pontífice deu as mãos ao sentimento atual de defesa inegociável do meio ambiente e buliu com aspectos comportamentais do cotidiano. Na encíclica Laudato Si’, condenou o antropocentrismo moderno, que considera o ser humano senhor absoluto da natureza. Corajoso, disse em entrevista que ser “homossexual não é crime”, embora possa “ser pecado”. Resumiu o vaticanista Marco Politi: “Ele acabou com a demonização da homossexualidade, com os debates sobre relações extraconjugais ou sobre contraceptivos (…) tudo isso saiu da primeira página”. Que bom. Seguir a toada do jesuíta Francisco é também acompanhar as dificuldades do cotidiano de um homem com evidentes problemas de saúde. Acometido de fortes dores nos joelhos, muitas vezes aparece em cadeira de rodas. A um só tempo objetivo e enigmático, a seu modo, chegou a admitir a renúncia. “O cansaço não te faz ver as coisas com clareza”, disse na semana passada. Salve a sinceridade de Francisco.
Publicado em VEJA de 22 de março de 2023, edição nº 2833