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Governo corre contra o calendário eleitoral e desidrata reforma da Previdência para tentar aprová-la até o início de 2018. Mas ainda faltam votos para tanto
Os próximos dias serão decisivos para a reforma da Previdência. O governo precisa encaminhar uma nova proposta logo, caso almeje ver o projeto ser votado na Câmara ainda neste ano, alertou o presidente da Casa, Rodrigo Maia. Como restam apenas quatro semanas para o recesso parlamentar, a tarefa é complicada. Se as negociações se estenderem, não haverá tempo hábil para votar o texto em 2017 — e, se isso ocorrer, crescem as chances de que o assunto só volte à tona no próximo governo. Michel Temer, portanto, corre contra o calendário eleitoral. A partir de março, os congressistas e o mundo político já estarão ocupados com a campanha eleitoral. A janela temporal é estreita, mas ainda é possível ver o texto aprovado.
Para alcançarem o objetivo, Temer e equipe buscam uma fórmula que desidrate a proposta original (cuja aprovação é considerada impossível na atual conjuntura), mas não a ponto de reduzi-la à insignificância. Os últimos dias têm sido de negociações sobre o que deve ser mantido para não desfigurar completamente a reforma. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, viu-se obrigado a ceder em algumas questões, como no abrandamento da regra de transição entre o velho e o novo sistema, mas foi intransigente em relação a uma meta: o texto reformulado deverá preservar ao menos metade da economia estimada com o projeto enviado em dezembro passado. Entre as medidas consideradas inegociáveis estão a exigência de uma idade mínima para a aposentadoria e a equiparação das regras do sistema público com as da iniciativa privada. A propósito, a extinção de privilégios do funcionalismo virou o mote do governo em sua tentativa de vender ao eleitorado a urgência da reforma.
No comando da Casa Civil, Eliseu Padilha declarou que não há muito mais em que ceder na reforma previdenciária, que já teria chegado “ao osso”. Ele se refere ao tempo mínimo de contribuição para receber o teto da aposentadoria, que será de ao menos quarenta anos. A idade mínima também chegou ao limite. Para requererem a aposentadoria, as mulheres deverão ter 62 anos, e os homens, 65.
Por se tratar de uma proposta de emenda constitucional (PEC), as mudanças precisam obter o consentimento de ao menos três quintos da Câmara (308 votos). O governo tem como certo o voto de 280 deputados. Com a reforma ministerial, pretende elevar a base de apoio — além de atender a outros interesses menos nobres (leia mais). No Senado, serão necessários 49 dos 81 votos. Temer, acuado pela resistência dos congressistas, cogitou deixar o projeto para o sucessor. Acabou convencido de que a desistência seria um equívoco: poderia trazer instabilidade para a economia e minar a retomada.
Não custa lembrar que as contas públicas permanecem frágeis. O governo acumula quatro anos de saldo negativo, e 2018 não será diferente. O rombo previsto é de 159 bilhões de reais. Assim, a reforma é essencial para impedir o agravamento do desequilíbrio ao longo dos anos. “Sem a aprovação, será possível atravessar 2018, mas o país ficará vulnerável a choques externos”, afirma o economista Marcos Mollica, sócio da Rosenberg Investimentos.
Não fosse a crise desencadeada pela delação dos irmãos Batista, da JBS, a reforma provavelmente estaria aprovada a esta altura. Mas isso é passado. Agora o governo precisa lidar com um novo ambiente político, já sob o contágio das eleições do próximo ano, em sua última batalha para aprovar a reforma. Pelo bem do país, que seja tão eficiente quanto foi na rejeição das denúncias contra Temer.
Publicado em VEJA de 22 de novembro de 2017, edição nº 2557