Em marcha acelerada
Aplicativo 99 é comprado pela chinesa Didi, ganha reforço financeiro para enfrentar Uber e torna-se a primeira startup brasileira avaliada em US$1 bilhão
Mais pessoas usam aplicativos de transporte em São Paulo do que em Nova York. O mercado brasileiro é o terceiro maior do mundo, atrás apenas do chinês e do americano. Essas são informações que ajudam a dimensionar a relevância do Brasil em um dos setores da economia mais afetados pelo avanço tecnológico. E explicam por que a startup mais valiosa do mundo, a chinesa Didi Chuxing, decidiu adquirir o controle da 99 (ex-99Taxis), em um negócio no qual a empresa brasileira é avaliada em 1 bilhão de dólares. Isso a torna o primeiro unicórnio do país, como é chamada a startup cujo valor atinge essa marca. Hoje a 99 (marca que se manterá) é a segunda maior empresa do mercado brasileiro de aplicativos de transporte, atrás da americana (e pioneira) Uber, mas cresce em ritmo mais acelerado. Tem uma base de 14 milhões de passageiros, que usam os serviços de mais de 300 000 motoristas (particulares e de táxis), em mais de 400 cidades. A Didi assumiu o controle da 99 ao comprar, por valor não revelado, participações de fundos e grupos estrangeiros — e um nacional — que haviam investido na companhia nos últimos anos.
A Didi era sócia da 99 havia um ano, quando decidiu injetar 100 milhões de dólares na empresa. Na ocasião, o negócio foi anunciado como uma parceria ambiciosa que ia além do aporte de capital. “O que há de mais avançado no mundo em tecnologia para transporte passará a ser implantado no mercado brasileiro”, disse a VEJA na ocasião o CEO da 99, Peter Fernandez. Era uma referência à atuação agressiva — fundamentada em inovação — da Didi nos diferentes mercados em que atua, mas especialmente na China, onde ela se notabilizou por derrotar a Uber a ponto de a empresa americana sair do país. Agora, a aquisição da 99 vai acirrar essa disputa no mercado brasileiro. Vai também reforçar a Didi para que ingresse e cresça em outros países da América Latina. Isso faz parte de uma estratégia de internacionalização: nos últimos meses, a empresa chinesa comprou participações em líderes de seus respectivos mercados de aplicativos de transporte, como a Ola (Índia), a Grab (Sudeste Asiático) e a Taxify (Leste Europeu).
A venda para a Didi coroa uma ascensão meteórica da 99. A empresa foi fundada em São Paulo em agosto de 2012 por três amigos — engenheiros de formação, mas empreendedores do mundo digital —, o argentino Ariel Lambrecht (que se mudou para o Brasil com menos de 2 anos) e os brasileiros Renato Freitas e Paulo Veras. Lambrecht inspirou-se em um aplicativo similar que conhecera em viagem à Alemanha. Os três colocaram dinheiro do próprio bolso na criação da 99 e, no começo, empenharam-se pessoalmente para explicar a taxistas como funcionaria o aplicativo. Pouco mais de um ano depois, a 99 já estava presente em mais de cinquenta municípios, tinha quase 30 000 taxistas cadastrados e recebia o primeiro investimento de empresas especializadas em apostar em startups. Dali em diante, a escalada só se acelerou até a chegada da Didi.
Publicado em VEJA de 10 de janeiro de 2018, edição nº 2564