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Meirelles sob pressão

Além de sofrer cobranças pelo fraco desempenho da economia, o ministro é forçado a fazer concessões para atender à voraz base política de Temer

Por Giuliano Guandalini Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Marcelo Sakate Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 18h10 - Publicado em 29 jul 2017, 06h00
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    (Fonte: Tesouro Nacional/VEJA)

    O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, está sob pressão como não esteve em nenhum outro momento nos quinze meses em que ocupa a pasta mais importante da Esplanada. E bota pressão nisso. De um lado, a economia ainda não reagiu da maneira que se imaginava quando Meirelles assumiu o cargo. De outro, as condições políticas atrapalharam avanços que pareciam certos. A reforma da Previdência, por exemplo, foi postergada às calendas gregas, e o plano de privatizações continua emperrado. A frustração na retomada contribuiu para aprofundar o rombo nas contas públicas, e não será fácil cumprir a meta estabelecida para este ano. Nesse cenário, o governo decidiu decretar um indigesto aumento nos tributos dos combustíveis, e os empresários, que deram apoio a Temer desde os primeiros dias de seu governo, sentiram-se traídos — o pato amarelo da Fiesp voltou a ser inflado na Avenida Paulista, em São Paulo. Queixam-se dos juros ainda elevados, apesar da queda sensível, e reclamam da falta de crédito nos bancos públicos. No centro disso tudo está Meirelles, cuja reputação ainda foi atacada por ter recebido 217 milhões de reais por serviços de consultoria prestados à J&F, dos irmãos Batista, e a duas empresas internacionais de investimentos.

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    (VEJA/VEJA)

    Seria injusto culpar Meirelles por todos os males da economia, sobretudo levando em consideração a ruína legada por Dilma Rousseff. Mas, para um governo que luta pela própria sobrevivência, jogar a responsabilidade na “herança maldita” não vai ajudar muito. Temer, cuja popularidade chegou a uma baixa desoladora e já é considerado ruim ou péssimo por 70% dos brasileiros, precisa apresentar resultados para dar legitimidade mínima a seu mandato. Em outra frente, o presidente necessita de votos para derrubar na Câmara o pedido de investigação contra ele, na sessão marcada para esta semana. Trata-se de um equilíbrio tênue. Nesse caso, mais uma vez as pressões recaem sobre a cabeça de Meirelles. É ele quem controla o caixa e deve zelar pela fragilíssima saúde das finanças públicas. Mas Temer, para dissuadir eventuais traidores, escolheu fazer concessões e abrir o cofre, autorizando verbas para os congressistas de sua base.

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    Existe, de fato, um embate dentro do governo. No lado correto do ringue, Meirelles e equipe se esforçam para ver aprovada a agenda de reformas econômicas e fazem o possível para apertar o cinto dos gastos públicos. Do lado errado do tablado, os articuladores de Temer no Congresso, com o senador Romero Jucá à frente, pressionam pela liberação de recursos. A contradição ficou evidente nas duas últimas semanas. Ao mesmo tempo em que tascou um aumento nos impostos dos combustíveis para arrecadar 10 bilhões de reais neste ano, o governo liberou mais de 2 bilhões de reais para emendas de parlamentares. Alguns dias depois, no entanto, anunciou que havia congelado 640 milhões de reais. Tal esquizofrenia se explica justamente pelas diferentes visões internas. Um pedaço do governo quer usar as verbas para preservar o mandato do presidente. O outro, não. Foi o caso da negociação de um repasse de 13 milhões de reais para o Carnaval carioca, gesto que traria o apoio do deputado Pedro Paulo (PMDB-RJ). A conversa existiu, e Pedro Paulo saiu feliz, dizendo que o dinheiro iria para a folia. Menos de 24 horas depois, o governo negou que vá liberar o montante. Foi mais um lance do jogo do “abre e fecha o cofre”.

    Um sinal de atrito no núcleo econômico do governo veio à tona no início da semana passada depois que o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, divulgou, sem o aval da Fazenda, um plano de demissão voluntária para o funcionalismo do Executivo. O objetivo é economizar 1 bilhão de reais ao ano, mas, na avaliação da equipe de Meirelles, o projeto requer uma análise mais detalhada. Ainda assim, Temer assinou uma medida provisória validando o projeto. Dyogo Oliveira ocupa a pasta que antes estava nas mãos de Romero Jucá, que se viu obrigado a voltar ao Senado depois do vazamento de áudios em que falava em “estancar a sangria” da Lava-Jato. Mas Jucá, líder do governo no Senado, continua a exercer influência sobre o Planejamento, pasta que trata diretamente do manejo da máquina pública.

    A pressão sobre Meirelles ocorre em um momento especialmente delicado das finanças públicas. O caixa do governo está na lona. No primeiro semestre do ano, o rombo entre as receitas e as despesas ficou em 56 bilhões de reais, o pior resultado em duas décadas. Isso ocorre porque, apesar do aperto no orçamento para obras e outros gastos, as despesas obrigatórias (aquelas regidas por leis específicas e que não podem ser adiadas) continuam em alta. Os gastos com a Previdência totalizaram 258 bilhões de reais. Com o funcionalismo, o desembolso foi de 137 bilhões de reais. Não é só herança maldita. Boa parte da culpa cabe ao próprio Temer, que autorizou, no ano passado, reajustes salariais para várias categorias de servidores. Ao mesmo tempo, a arrecadação tributária permanece estagnada. No acumulado dos últimos doze meses, o rombo fiscal alcançou 183 bilhões de reais.

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    ECONOMIA E POLÍTICA – Meirelles em reunião com Jucá, líder no Senado, e ministros: o cobertor é curto
    ECONOMIA E POLÍTICA – Meirelles em reunião com Jucá, líder no Senado, e ministros: o cobertor é curto (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

    A meta oficial do governo é encerrar o ano com um déficit primário (ou seja, excluindo-se os gastos com a dívida pública) de 139 bilhões de reais. Trata-se de um valor abissal. Ainda assim, o objetivo parece difícil de ser alcançado. Para muitos analistas, é provável que a meta seja revista. “Seria um péssimo sinal, caso isso ocorresse”, afirma o economista Juan Jensen, sócio da 4E Consultoria. “O pior da crise econômica ficou para trás, e o desemprego parou de aumentar. Mas as contas não fecham.”

    PATO E FILAS – A Fiesp protestou contra o aumento dos tributos, e os motoristas encheram o tanque antes dos reajuste
    PATO E FILAS – A Fiesp protestou contra o aumento dos tributos, e os motoristas encheram o tanque antes do reajuste (Charles Sholl/Futura Press e Pedro Ladeira/Folhapress)

    Meirelles e equipe não jogaram a toalha e acreditam ser possível cumprir a meta. “Se não houver novas frustrações de receitas, é provável que cumpramos a meta sem revisões”, diz um técnico da Fazenda. Para que isso ocorra, contudo, o governo vem reduzindo drasticamente os repasses de verbas de custeio dos ministérios. Algumas pastas dispõem de recursos para operar normalmente por apenas mais dois meses. “Há o risco de chegar o fim do ano e termos ministérios com as luzes apagadas por falta de recursos? Sim, existe esse risco”, reconhece, sem meias palavras, uma fonte do governo. Na avaliação do diretor da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco, especialista em finanças públicas, o aperto foi agravado porque o governo cometeu dois erros básicos. O primeiro foi ter contado com receitas extraordinárias para fechar sua contabilidade. Entra nesse cálculo o dinheiro obtido com privatizações, concessões e outras fontes não recorrentes. O volume desses recursos, até agora, foi decepcionante. O outro erro foi ter concedido reajustes de dois dígitos a diversas categorias do funcionalismo, uma conta que custará 22 bilhões de reais em 2018.

    A esperança de dias melhores para as finanças públicas é que a retomada econômica ganhe força nos próximos meses, ao mesmo tempo em que avançam os projetos de privatizações e concessões públicas. Assim haveria um aumento da arrecadação, desafogando o governo. A situação neste momento, entretanto, é de penúria atroz. O governo conta os centavos, cancela projetos e estuda, agora, adiar o aumento nos vencimentos dos servidores — algo para lá de razoável, diante da realidade de desemprego e arrocho no setor privado.

    Meirelles tem se empenhado em divulgar, para os investidores brasileiros e internacionais, o discurso de que a situação permanece sob controle. Nas últimas semanas, o ministro participou de conferências com clientes de bancos estrangeiros e administradores de recursos no Brasil. Em uma dessas conversas, ele lembrou que o governo conquistou vitórias importantes, sendo a aprovação da reforma trabalhista a mais recente delas. A inflação foi controlada, e os juros estão em queda. O ministro deu ainda uma informação que surpreendeu os participantes desses encontros: disse ser possível aprovar a reforma da Previdência, embora com algumas concessões, até outubro. “Na visão de Meirelles, Temer fica no cargo, e com isso a reforma anda”, diz um dos participantes de uma conferência com investidores. “A aposta da Fazenda é que a economia chegue a 2018 em um ritmo de crescimento mais forte.” O esforço de comunicação do ministro tem funcionado. O mercado financeiro continua em um mar tranquilo, de águas surpreendentemente calmas, em pleno caos político.

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    Existe muito chão, porém, até 2018. Poderão surgir novas delações bombásticas nas próximas semanas, e as reformas ficariam em risco. Tudo isso está no radar dos investidores. Para eles, entretanto, enquanto a equipe econômica estiver intacta e comprometida com os ajustes, o governo contará com a complacência dos mercados. Temer sabe disso. Por isso, mesmo sob pressão, Meirelles fica e é o grande fiador desta administração.


    Juros: de volta a um dígito

    Por Bianca Alvarenga

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    (VEJA/VEJA)

    O Banco Central decidiu, na semana passada, cortar em 1 ponto porcentual a taxa básica de juros, a Selic, que serve de referência para o custo do dinheiro na economia. Ela foi reduzida de 10,25% para 9,25% ao ano. É a primeira vez desde outubro de 2013 que o indicador fica abaixo dos 10%. O processo de redução dos juros começou paulatinamente em outubro do ano passado, quando ficou claro que a inflação havia entrado em trajetória descendente. Naquele mês, a inflação estava em 8,5%, e a Selic, em 14,25%.

    Apesar da pressão do empresariado, que cobra a redução do custo do crédito em um ritmo mais acelerado, o presidente do BC, Ilan Goldfajn, e os diretores do banco têm mantido o gradualismo em suas decisões. Em junho, a inflação acumulada em doze meses caiu para 3% — o menor porcentual em uma década. Ainda assim, o BC sinalizou, em seu comunicado, que pretende avaliar com precaução a conjuntura. A cautela tem razão de ser: o comando do banco sabe que não se deve baixar os juros sem uma vigilância rigorosa sobre a inflação. O passado recente serve de lição. A ex-presidente Dilma Rousseff iniciou, em seu primeiro mandato, uma empreitada para tentar baratear o crédito por meio da queda da Selic, apesar de as perspectivas para a inflação não estarem dentro da meta oficial. A taxa básica de juros chegou a cair para 7,25%. Em paralelo, Dilma tentou controlar artificialmente o preço de tarifas, como as de energia. A política desastrada resultou em uma inflação que superou o patamar de 10% em 2015, algo que não acontecia desde o primeiro mandato de Lula. Pressões inflacionárias podem surgir a qualquer momento, como é o caso do reajuste dos combustíveis. Daí a opção do BC pela cautela.

    Se não houver nenhuma nova surpresa, a expectativa predominante no mercado é de que a Selic chegue a 8% no fim do ano — ou até menos. Será um alento para a ainda combalida economia brasileira. O alívio nos juros contribui para atenuar a carga das dívidas das empresas e incentiva os investimentos produtivos, como em obras de construção civil. Assim a retomada poderá ganhar força e gerar empregos. Desta vez, sem artificialismos nem pedaladas.

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    Publicado em VEJA de 2 de agosto de 2017, edição nº 2541

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