A economia brasileira está longe de viver dias de euforia como os vistos dez anos atrás, antes da debacle internacional e da crise gestada pelos governos Lula e Dilma. Por isso, é surpreendente que o principal índice de ações da bolsa de valores de São Paulo, o Ibovespa, tenha atingido a maior pontuação de sua história. Afinal, o país sofre para sair da recessão, o desemprego ainda é extraordinariamente alto e muitas empresas e consumidores estão atolados em dívidas. E, por último, mas não menos importante, o governo enfrenta sérias dificuldades políticas e fiscais.
Ainda assim, no início da semana, o Ibovespa superou 74 000 pontos pela primeira vez em sua história. Anteriormente, o pico de valorização havia ocorrido em maio de 2008 (veja o quadro na pág. ao lado). Naquele período, a situação era outra: a economia crescia ao ritmo de 5% ao ano, o país era celebrado internacionalmente como um caso de sucesso e os investidores estrangeiros faziam fila para depositar dólares nas companhias brasileiras. O fato de a bolsa ter saído do buraco, agora, significa em primeiro lugar a percepção da melhora no ambiente econômico, depois da mais profunda e duradoura recessão brasileira. Costuma-se dizer que o mercado financeiro antecipa a economia real. Esta seria a hora, portanto, de fazer as apostas e colher os lucros mais adiante. O quadro de juros em queda também ajuda. O rendimento de aplicações mais seguras, como os fundos DI e de renda fixa, desabou. A taxa Selic, referência para diversas aplicações, deverá recuar para 7% nos próximos meses. Dessa maneira, os grandes investidores passaram a caçar oportunidades na chamada renda variável: ações e fundos mais arriscados. Nesse mercado é possível obter rentabilidade superior, mas as oscilações são constantes. Trata-se de um ambiente inóspito aos investidores despreparados, sobretudo em uma economia instável como a brasileira. A receita clássica para aqueles que quiserem se aventurar nessa seara é procurar informações detalhadas sobre as empresas e os fundos, além de diversificar as aplicações.
Entre as empresas mais valorizadas neste ano aparecem grandes grupos de varejo, porque o alívio no bolso dos brasileiros tem se traduzido em um aumento do consumo. É o caso do Magazine Luiza (+469%), da Guararapes, a dona da Riachuelo (+130%), e das Lojas Renner (+66%). Os papéis das estatais Petrobras e Eletrobras também subiram nos últimos meses, graças a fatores como a redução da interferência política e o combate à corrupção. A conjuntura externa, de juros historicamente baixos, é outro componente que ajuda na valorização das ações brasileiras: os estrangeiros são atraídos pelas perspectivas de ganhos superiores aos que seriam obtidos em países desenvolvidos.
Embora a alta recente seja alvissareira, parte dela não passa de uma recuperação do tempo perdido. Se o Ibovespa for ajustado pelo dólar ou pela inflação acumulada no período desde o recorde anterior, em 2008, vai se perceber que há espaço para ganhos. Em dólares, o preço médio das ações equivale aproximadamente à metade de seu valor de nove anos atrás. Para os estrangeiros, os papéis ficaram baratos. Ajustado pela inflação, o índice atual está 40% abaixo do patamar de 2008. Os cálculos são da empresa Economatica.
Tudo leva a crer, portanto, que há espaço para novas altas. Isso dependerá da credibilidade da gestão econômica e dos ajustes das contas públicas. Caso algum candidato presidencial populista, à esquerda ou à direita, ganhe força nas pesquisas, os investidores vão rever suas compras de ações. Mas, se as reformas prosseguirem e se houver uma aceleração do crescimento, as ações deverão subir mais — especialmente se o Brasil recuperar o grau de investimento. Espera-se que seja esse o caminho: assim, as empresas terão mais capital para investir, incentivando a criação de empregos e o desenvolvimento.
Publicado em VEJA de 20 de setembro de 2017, edição nº 2548