A saída de cena do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva reduz as incertezas e os riscos de uma guinada populista na condução da economia pelo próximo governo. O petista era o candidato com chances reais de vitória que mais havia encampado o discurso de que é preciso mudar radicalmente a política econômica vigente, ainda que o país tenha voltado a crescer e a gerar empregos. Lula questiona a reforma da Previdência nos moldes propostos pelo governo de Michel Temer e critica tanto a reforma trabalhista aprovada pelo Congresso no ano passado quanto a lei que estabelece um teto para o aumento dos gastos públicos. Na quarta-feira 4, dia da decisão do STF, o mercado financeiro refletiu a ansiedade dos investidores: as ações tiveram leve recuo, e o dólar subiu. As projeções de juros futuros se elevaram, um reflexo da avaliação de que o Banco Central seria obrigado a aumentar as taxas para conter pressões sobre os preços, uma vez que Lula prometia pisar no acelerador dos gastos públicos para estimular a demanda. Na quinta-feira, entretanto, com a notícia da derrota do ex-presidente na Justiça, o mercado comemorou, mas sem grande euforia: o Ibovespa, o principal índice da Bolsa de São Paulo, teve ligeira alta de 1%, e o dólar abriu em queda. Na sexta-feira, nova virada: a bolsa voltou a registrar uma ligeira baixa. A gangorra dos mercados demonstra, antes de mais nada, o elevado grau de incerteza que ainda paira sobre os ânimos dos investidores nacionais e estrangeiros.
“A hipótese de Lula não ser preso trazia certo nervosismo porque era algo que poderia validar a sua candidatura. Havia preocupação porque, alguns meses atrás, o petista abandonara o tom conciliador e vinha sendo agressivo nos seus discursos”, diz André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos. O temor de uma reviravolta na economia foi fundamentado em declarações recentes do próprio líder petista. Ele passou a defender uma guinada nos rumos da economia, com o uso de bancos estatais para ampliar o crédito ao setor privado, além da suspensão das privatizações. É um receituário defendido ao longo dos treze anos e meio do PT no poder — no início de maneira um pouco mais equilibrada, até meados do segundo mandato de Lula. A crise financeira de 2008, porém, abriu caminho para uma fase mais agressiva do chamado capitalismo de Estado, especialmente via liberação de crédito a juros subsidiados pelos bancos públicos. Essa fase acabou sendo aprofundada no primeiro mandato da ex-presidente Dilma Rousseff, quando ela tomou medidas radicais — como a redução, de forma unilateral, da conta de luz e da taxa básica de juros — que minaram a confiança de empresários, consumidores e investidores. A prova inequívoca dos males causados pela política intempestiva foi a recessão de 2015 a 2017, uma das mais prolongadas e profundas da história do país. Não faltaram exemplos de desperdício de dinheiro público, por meio de corrupção, de ingerência política ou simplesmente de más decisões administrativas. Caso emblemático é o da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. Segundo cálculos iniciais, de 2005, ela deveria ser erguida por 2,3 bilhões de dólares, mas a última estimativa apontava um custo acima de 20 bilhões de dólares. Trata-se da mais cara refinaria do mundo.
Se Lula ficar de fato fora do páreo, a bandeira de mudança brusca nos rumos da economia será herdada pelo seu substituto como candidato do PT. O discurso, porém, se esvaziará sem a figura de seu principal líder. Assim, tendem a se fortalecer os candidatos de centro-direita dispostos a perseverar nas reformas, o que agradaria aos investidores. “O país não tem mais gordura para queimar. A política com participação maior do Estado, por meio de bancos públicos, e ajuda pontual a alguns setores já mostrou que gera graves desequilíbrios”, diz a economista Alessandra Ribeiro, sócia da consultoria Tendências. O próximo presidente, lembra ela, terá de se dedicar a uma pesada agenda de ajustes, que inclui a retomada da reforma da Previdência. Sem Lula, o cenário fica menos turvo — mas novas reviravoltas podem ocorrer.
Publicado em VEJA de 11 de abril de 2018, edição nº 2577