A (boa) vida sexual na terceira idade
Mostra nas ruas do Reino Unido traz fotos de idosos em cenas sensuais e deflagra o debate sobre o assunto
Há poucos dias, as ruas do Reino Unido foram tomadas por centenas de imensos painéis com fotos em preto e branco expondo cinco casais nus, em situações sensuais. Eles mostram beijos ardorosos, mulheres insinuando o prazer da masturbação e homens em abraços íntimos. Não fariam muito barulho, em cidades que aos poucos retomam a rotina da pandemia controlada, não fosse a idade dos personagens, dos 65 aos 87 anos. A campanha, batizada de Vamos Falar sobre a Alegria do Sexo na Terceira Idade, foi criada pela ONG britânica Relate em parceria com a agência de publicidade Ogilvy. “Há um grande pudor a respeito do tema, e no Brasil não é diferente”, disse a VEJA o brasileiro Dedé Laurentino, diretor-geral da empresa de propaganda. “O silêncio não significa que não tenham vida sexual.”
A ruidosa ação publicitária escancara uma discussão que já deveria ter sido deflagrada há tempos. O estereótipo de uma velhice assexuada vem sendo derrubado por pesquisas recentes. Levantamento feito com idosos, conduzido pela Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, mostrou que para 74% dos entrevistados o sexo é fundamental no relacionamento (veja no quadro abaixo). No Brasil, o pioneiro site de relacionamento Coroa Metade, cujo inventivo nome e os seguros protocolos de acesso ajudaram a atrair mais de 600 000 cadastrados, pediu, em uma pesquisa recente, que os inscritos, todos na maturidade, indicassem o grau de relevância de diversas características dos pares em busca de companhia. Para 42% dos homens, ser “bom de cama” foi classificado como “muito importante”.
A vida sexual longeva, porém, é conquista recente. Ela está associada às mudanças morais da sociedade, especialmente em relação às mulheres. Até bem pouco tempo atrás, era comum, aos primeiros sinais do envelhecimento do corpo, elas deixarem de procurar um parceiro. Com a menopausa, o estrógeno diminui drasticamente, atingindo o desejo e a lubrificação. No corpo masculino, a produção da testosterona, o hormônio sexual, começa a cair aos poucos a partir dos 40 anos, mexendo na libido e na ereção. A medicina hoje, contudo, é capaz de driblar parte dos problemas.
Os homens são os mais beneficiados, com uma diversidade de remédios que estimulam e ereção. Na ponta do lápis: cerca de 70 milhões de prescrições do Viagra, o mais antigo medicamento de sua categoria, já foram emitidas em todo o mundo. As mulheres podem recorrer à reposição hormonal e a cremes. São avanços notáveis. “Um homem e uma mulher de 70 anos podem ter hoje uma qualidade no relacionamento sexual semelhante ao que mantinham aos 50 anos”, diz a psiquiatra Carmita Abdo, coordenadora do Programa de Estudos em Sexualidade da USP.
A atividade sexual, não há dúvida, prolonga a vida. O hábito regular, seja na frequência que for, eleva os níveis de hormônios, como a oxitocina, que ajuda a reduzir o stress, e aumenta os níveis de imunoglobulinas, responsáveis pelo combate a infecções. Convém dar as mãos ao poeta irlandês William Butler Yeats, que, em 1938, cunhou uma bela frase: “Parece-te horrível que luxúria e ira cortejem a minha velhice; quando jovem não me flagelavam assim”.
Publicado em VEJA de 19 de maio de 2021, edição nº 2738