A bancária Adéli Debei Serra, 34, entendeu a importância da doação de leite materno ainda na gestação. Ela e uma colega de trabalho estavam grávidas ao mesmo tempo e o bebê da amiga nasceu com apenas 23 semanas. Foi quando Adéli conheceu a UTI neonatal e ficou tocada pelo sofrimento das mães cujos bebês estavam internados e escolheu ser doadora. “Se as mães que têm leite para doar pudessem visitar uma UTI neonatal, certamente entenderiam como um ato simples, que não dá trabalho e não custa dinheiro, pode salvar vidas”, acredita.
A vontade de ajudar outros bebês e suas mães foi também o que motivou a nutricionista Tatiane Graciano Domingues Silva, 34 – mãe de Lucas, 5; e Pedro, 2 anos e 8 meses –, a fazer a escolha de doar seu leite para um banco. “Saber que eu estava oferecendo um leite supernutritivo e extremamente adequado a outras crianças me motivou a doar. Algumas vezes o cansaço era intenso, mas eu me esforçava porque tinha um conhecimento prévio muito sólido dos benefícios do leite materno para os recém-nascidos”, lembra Tatiana.
De acordo com Gabriela Malzyner, psicóloga do Centro de Dificuldades Alimentares do Instituto Pensi, ligado ao Hospital Infantil Sabará, a escolha faz bem não apenas a quem recebe o leite, mas a quem doa também. “A possibilidade de ver que aquilo que produzimos serve ao outro, o ajuda e o nutri traz uma satisfação interessante a quem oferta. O leite materno é um produto único. E ser capaz de dar algo tão valioso a outra pessoa é uma experiência de gratificação e empatia”, afirma.
Adéli concorda. “Cada vez que eu olho para o meu Lucas – hoje com 5 meses – crescendo saudável e feliz, meu coração brilha por saber que outras crianças podem ter a mesma oportunidade. Sabe o dito ‘amor dividido é amor multiplicado’? Pois é isso. O leite que transborda em mim faz transbordar amor em uma criança que precisa disso para se fortalecer, e não tem nada mais gratificante do que isso.”
Doação de saúde
A gestação da analista financeira Renata Chang Alcoba Marques, 35, foi complicada. Seu filho, Arthur, hoje com 5 meses, nasceu com apenas 1,4 quilo, após 33 semanas de gestação. Assim que começou a se alimentar por sonda, recebeu leite materno do banco de leite do hospital. “Meu leite não havia descido e, se não fosse a disposição das mães que doam, apesar do cansaço e de todas as mudanças dessa nova fase, meu filho não teria recebido leite materno. A gente não espera essa compaixão e agradeço todos os dias”, emociona-se Renata, que doou dois frascos de leite ao banco quando o filho teve alta. Hoje, ela amamenta o bebê e tira leite com a bombinha, com o objetivo de doar o excedente para um banco no futuro.
A dona de casa Cristiane Soares de Andrade Edueta, 32, também teve seu filho, João Vitor – hoje com 1 ano e 7 meses –, prematuro e não pôde amamentá-lo porque ela passou dois dias na UTI após o parto. O banco de leite foi a salvação. “Sou eternamente grata. Sem as doações, meu bebê talvez não fosse tão saudável hoje. O leite materno faz muita diferença na saúde e imunidade, ainda mais nas primeiras horas de vida”, diz.
Cristiane, que ainda hoje amamenta João Vitor, tem razão. Não é à toa que os neonatologistas prescrevem a alimentação com leite humano aos nascidos prematuros. “Ele ajuda a melhorar a evolução do quadro clínico dos bebês nas UTIs. Além dos nutrientes, possui fatores imunológicos ativos que contribuem com a defesa do organismo. É o alimento mais completo para todo recém-nascido”, explica Maria Mercedes, nutricionista do banco de leite do hospital e maternidade Santa Joana.
Como doar
Não é necessário ir até o banco de leite para fazer uma doação. Basta entrar em contato com o banco de leite mais próximo da região que um funcionário irá até você para retirar o leite. Alguns, inclusive, oferecem frascos esterilizados para armazenamento.
Segundo Sonia Cristina de Souza, enfermeira do Banco de Leite do Hospital Maternidade Leonor Mendes de Barros, a ordenha pode ser manual ou com bombinha elétrica, tendo em mente os cuidados com a higiene: lavar mãos e antebraços, usar touca e máscara. O recipiente onde o leite será armazenado deve ser previamente esterilizado, fervido por 15 minutos e seco naturalmente, sem o auxílio de panos. Após a retirada, o vidro deve ser etiquetado com a data da primeira retirada e levado diretamente ao freezer ou congelador.
Para doar, basta que a mãe apresente excesso de leite e seja saudável. “A restrição são mulheres usuárias de drogas ou que estejam tomando algum medicamento contraindicado. Se for fumante, não pode consumir mais de 10 cigarros por dia”, alerta Sonia. Para garantir a boa produção de leite, é preciso beber pelo menos dois litros de água ou outros líquidos por dia, se alimentar bem e descansar.
Mais do que oferecer alimento a quem precisa, fazer a escolha de doar leite materno é formar uma corrente de amor em que todos saem beneficiados. “Além de auxiliar na manutenção e no aumento da própria lactação, a doadora oferece qualidade de vida para os bebês que receberão esse leite. Para o recém-nascido, esse leite representa vida. E para quem doa, saúde e bem-estar”, diz Maria Mercedes, do Santa Joana.
Conheça também a história de Camile, que escolheu extrair o próprio leite no banco da maternidade para complementar a amamentação de Eva, sua filha. Ela é mais uma prova de que doar leite é uma escolha para uma vida.
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