Lilian Ribeiro fala sobre impacto de anunciar seu câncer de mama na TV
"Quem está em um processo como este precisa se acolher, não se exigir demais e imaginar que vai ser uma fortaleza todos os dias", afirma
Desde que uma prima de 31 anos de idade teve o diagnóstico de câncer de mama (ela faleceu no dia 8 de setembro deste ano), tenho o hábito de fazer o autoexame dos seios. Em agosto, durante a palpação, achei um nódulo. Meu ginecologista encontrou outro. Os exames de imagem comprovaram a doença. A partir aquele dia, passo por momentos difíceis. Você não sabe o que vem pela frente. São muitas perguntas e há uma sensação de impotência em saber que está doente, que há uma coisa dentro de você que não controla. Levei um tempo até me reconectar comigo. Na verdade, continua sendo um desafio diário pensar nas coisas que posso fazer por mim, até aonde posso agir, o que não posso controlar e aprender a conviver com isso. Há dias em que me sinto fraca, e esses eu controlo pouco. Aí me deixo descansar. Dizer “hoje não dá” é algo que faço por mim. Não escondi nada da minha família e amigos. Na redação da GloboNews, onde trabalho, também não era segredo o que estava acontecendo comigo. Queria continuar trabalhando, mas o cabelo começou a cair e tive de decidir o que era melhor para mim. Comprei uma peruca, mas não me acostumei. Pensei em usar um lenço e levei a questão para a direção da GloboNews. O chefe de redação, Carlos Jardim, e a editora-chefe, Camila Tonin, me apoiaram, mas foi uma decisão pessoal usá-lo e falar sobre o câncer. Pouco antes de entrar no ar, estava muito preocupada em me emocionar demais e não conseguir dizer. Mas falei. Percebi que as pessoas entenderam que compartilhar a informação não era sobre me vitimizar, mas ser transparente e explicar por que estava aparecendo daquele jeito na televisão. Fiquei impressionada com o retorno. Estou feliz que as mulheres tenham se sentido representadas e, de alguma maneira, ouvidas. Teve uma história que me tocou em particular: mãe e filha foram diagnosticadas ao mesmo tempo. Fiquei pensando que a vida é assim e a gente não percebe, mas muitos estão convivendo com problemas grandiosos em momentos delicados. Por isso, saber que as mulheres se sentiram fortalecidas com o que eu disse também me fortaleceu. Tem sido uma troca.
É difícil falar sobre o câncer abertamente. Há pessoas que se sentem obrigadas a viver a doença em segredo, mas acho importante que tenhamos uma sociedade na qual haja espaço para quem quiser falar sobre seu diagnóstico. Descobrir um câncer e ter de fazer um tratamento já é difícil o suficiente para ter de ainda conviver com esses tabus. Depois do meu depoimento na tevê, ouvi pessoas dizerem que eu sou forte. Mas não é exatamente sobre força, e sim sobre aceitação da vida. De uma hora para outra, você passa a ter desafios enormes para cumprir, sendo o principal restabelecer sua saúde e continuar vivo. As coisas pequenas ganham outro valor, como o fato de poder levantar e fazer as coisas mais simples sem se sentir tolhida pelos efeitos dos remédios. É uma transformação. Como li num texto de uma paciente que dizia: “O câncer é transformador, mas melhor seria não passar por ele”. Hoje, o meu maior compromisso é com a minha saúde. Estou em um esquema de trabalho flexível. Só trabalho quando me sinto realmente bem. Se em algum momento for melhor parar de trabalhar, paro. Também estou vivendo outra rotina na minha casa, com a minha filha Giovana, de 5 anos, que percebe quando não estou muito bem, mas entende. Nos momentos difíceis, faço minhas orações, ouço música e tenho conversas sinceras com Deus. Quem está em um processo como este precisa se acolher, não se exigir demais e imaginar que vai ser uma fortaleza todos os dias, porque não vai. E conseguir ter essa conexão consigo mesma para não se perder. É esse o caminho. Como diz a minha mastologista: “Bora viver!”.
Lilian Ribeiro em depoimento dado a Simone Blanes
Publicado em VEJA de 1 de dezembro de 2021, edição nº 2766