Enquanto os passageiros da Uber no Brasil aguardam pela chegada de seu Logan com balinhas de hortelã, o futuro do transporte urbano também está dobrando a esquina, mas em carros voadores — e o país é um dos protagonistas nesse projeto. A EmbraerX, braço de negócios disruptivos da Embraer, anunciou hoje o modelo da aeronave que prepara para o Uber Elevate, iniciativa de mobilidade aérea da empresa do Vale do Silício que se tornou sinônimo de transporte pedido por aplicativo. A ideia é que seja possível trafegar pelo céu das grandes cidades, sobrevoando os congestionamentos, em meio a bases aéreas (semelhantes a helipontos) espalhadas em pontos estratégicos.
Outras cinco empresas — Boeing, Bell, Pipistrel, Karen e Jaunt — também estão desenvolvendo seus protótipos. Todas estão presentes na terceira edição do Uber Elevate Summit, em Washington, nos Estados Unidos. O modelo da EmbraerX, por enquanto apresentado apenas digitalmente, chamou atenção no evento pela simplicidade. “Não será uma aeronave VIP, exclusiva, mas algo para uso da massa”, disse no início desta tarde Antonio Campello, CEO da EmbraerX, que participará de um dos painéis do congresso.
A tradução do “simples”: com um design que mistura asas e rotores (haverá oito na horizontal para a subida e dois na vertical para que o veículo vá para frente), a ideia é reduzir o número de movimentos que o veículo precisa fazer, do pouso à decolagem, minimizando a complexidade da manutenção. Hélices não serão visíveis durante a viagem e há esforço para produzir o menor ruído possível. “Não adianta voar sobre o tráfego congestionado, mas antes disso levar quinze minutos para entrar, como pode acontecer um helicóptero”, diz André Stein, Head de Estratégia da EmbraerX.
O desenho do espaço interno busca semelhanças com SUVs. Nas pesquisas com potenciais passageiros, a empresa percebeu a importância de assemelhar um entorno ao de um carro, para trazer a familiaridade. “Não basta ter um produto seguro. Usuários querem se sentir seguros.” Durante a fase de pesquisa, um dos entrevistados disse que gostaria de se sentir em uma Kombi.
O eVTOL (“e”de elétrico; “VTOL” de pousos e decolagens verticais, na sigla em inglês) da EmbraerX será movido a bateria, uma solução para diminuir custos de operação e reduzir o impacto ambiental das viagens. Ainda não há previsão de custos para o usuário final.
A Uber iniciará em 2020 testes do carro voador em três cidades — as americanas Dallas e Los Angeles e, conforme anunciado nesta tarde, Melbourne, na Austrália. Havia especulações de que São Paulo pudesse ser a terceira do grupo. A capital paulista registra o maior número de viagens diárias da Uber no mundo. O governador João Doria encontrou-se neste ano com membros do Uber Elevate para falar sobre o projeto.
O cronograma da Uber prevê o início da operação comercial em 2023. O CEO da EmbraerX não confirmou se o modelo brasileiro estará pronto para os primeiros testes. Campello disse que a prioridade é criar um protótipo que não apenas chegue na frente, mas que seja certificado por órgãos de aviação internacional.
Veículo será movido a bateria, para reduzir o impacto ambiental das viagens
Mobilidade em três dimensões
O Uber Elevate Summit, sediado no Ronald Reagan Building, a alguns quarteirões da Casa Branca, teve em sua abertura imagens apocalípticas (e reais) de congestionamentos ao redor do mundo. Eric Allison, Head da Uber Elevate, resumiu no palco o propósito da empresa de repetir na mobilidade a verticalização das cidades: “O transporte ainda acontece em duas dimensões (no plano terrestre), enquanto as pessoas vivem em três dimensões”.
É a tradução mais próxima no mundo real do que mostrava décadas atrás o desenho animado Os Jetsons. Para além das vantagens, a ideia de transporte aéreo de massa, porém, pode causar calafrios, especialmente um dia depois do choque fatal de um helicóptero com um edifício em Nova York, mas a Uber diz estar empenhada em construir modelos seguros, com redundância nos elementos de estabilidade do voo. O tema foi um dos principais do congresso, que vai até amanhã e tem entre os palestrantes representantes de órgãos como a FAA (Federal Aviation Administration, dos EUA) e a Nasa, envolvidas na desenvolvimento de uma malha urbana aérea. Elaine Chao, secretária de Transportes dos Estados Unidos, alertou em sua palestra que para tornar o projeto viável é necessário conquistar o apoio dos moradores das cidades, afastando problemas como riscos de acidentes e ruídos, por exemplo. “Sem a aceitação do público, essas tecnologias jamais atingirão seu completo potencial.”