Drones começam a ganhar os céus para finalidades comerciais e pacíficas
Da pulverização de lavouras ao transporte de exames médicos
![1,2,3... TESTANDO - Experimentos pelo ar: gigantes como Amazon e iFood avaliam potencial dos veículos não tripulados](https://gutenberg.veja.abril.com.br/wp-content/uploads/2023/06/000_9PH7FE.jpg.jpg?quality=90&strip=info&w=1280&h=720&crop=1)
Archibald Low (1888-1956), um excêntrico cientista militar britânico, tinha um plano para poupar a vida dos pilotos ingleses nas primeiras batalhas aéreas da I Guerra Mundial. Ele projetou, em 1916, uma engenhoca voadora carregada de explosivos com o objetivo de atacar os zepelins alemães que bombardeavam a costa da Inglaterra. Detalhe: sem tripulação a bordo. Feito de madeira e estanho, o monoplano com asa surrupiada de uma aeronave, hélice superdimensionada e motor de 35 cavalos era controlado por rádio. O “pequeno avião esquisito”, como a invenção foi descrita na época, frustrou Low e os altos escalões oficiais no voo de teste: disparou, deu uma volta e caiu a metros do caminhão que o lançou feito catapulta. Apesar do fracasso, o professor tinha certeza de que aquilo poderia revolucionar um dia o campo de batalha. Ele havia criado o antepassado de um drone.
![A drone sprays pesticide over a rice field in Nakhon Sawan NO CAMPO - Controle de pragas: dispositivo lança pesticida sobre plantação](https://gutenberg.veja.abril.com.br/wp-content/uploads/2023/06/GettyImages-1248127237.jpg.jpg?quality=90&strip=info&w=1024&crop=1)
Os veículos aéreos não tripulados se tornaram, no século XXI, um dos principais instrumentos de estratégia militar. Estima-se que só os Estados Unidos tenham feito, entre 2008 e 2012, 145 ataques na Líbia, 48 no Iraque e mais de 1 000 no Afeganistão com esses dispositivos. Russos e ucranianos têm usado o recurso. Mas, assim como o micro-ondas e o GPS, que também brotaram do mundo bélico, os drones ultrapassaram as fronteiras originais. Com a expansão da tecnologia, indústrias passaram a enxergar neles ferramentas para fins pacíficos, seguros e lucrativos. Muito além de um brinquedo que caiu nas graças da população, esses aparelhos estão, pouco a pouco, ganhando ares em outros setores da economia.
Um dos principais é a agricultura. Drones começam a ser popularizados para monitorar as lavouras, gerenciar a irrigação e pulverizar produtos para controle de pragas. Equipados com câmeras de alta resolução e sensores, fornecem imagens aéreas em tempo real, que ajudam a avaliar problemas e a otimizar recursos. No Brasil, a ModelWorks, startup sediada em São Carlos, no interior paulista, acaba de lançar uma máquina especialmente desenvolvida para a pulverização de insumos e pesticidas. Fora a vantagem da precisão, a tecnologia promete segurança aos produtores e zelo com o ambiente. “O potencial de redução no consumo de água chega a até 80%”, diz Henrique Moritz, cofundador da startup. “Com o maior controle da aplicação, também eliminamos o risco de contaminação das áreas vizinhas.”
![DETALHE Credito-Arvore-Filmes–1-.jpeg NA PAZ - Envio de amostras de exames: Hermes Pardini cria primeira rota nacional](https://gutenberg.veja.abril.com.br/wp-content/uploads/2023/06/DETALHE-Credito-Arvore-Filmes-1-.jpeg.jpg?quality=90&strip=info&w=1024&crop=1)
Outros segmentos buscam decolar com ideia semelhante. O laboratório de análises clínicas Hermes Pardini inaugurou a primeira rota de transportes de amostras biológicas por meio de drones na região metropolitana de Belo Horizonte. No primeiro momento, serão conduzidos apenas materiais não contaminantes, como testes do pezinho e fios de cabelo para investigações toxicológicas. O segundo passo é ampliar para exames de sangue e afins. “Já estamos pleiteando autorização para transportar materiais biológicos de outras categorias para que possamos beneficiar o acesso a métodos de diagnóstico, especialmente em áreas remotas ou de difícil acesso”, diz Cleber Miranda, gerente de logística do Hermes Pardini, que utiliza equipamentos da Speedbird Aero.
![Ukranian Military Train Drone Pilots For War NA GUERRA - Reação: ucranianos usam drones com bombas contra russos](https://gutenberg.veja.abril.com.br/wp-content/uploads/2023/06/GettyImages-1255668010.jpg.jpg?quality=90&strip=info&w=1024&crop=1)
Entregas com drones deixaram de ser peça de ficção científica futurística, mas, sob a perspectiva da larga escala, ainda esboçam voos tímidos na realidade. Em 2013, Jeff Bezos, o CEO da Amazon, previa que as pequenas naves levariam pasta de dente e comida de gato para as casas dos americanos em cinco anos. A profecia não se cumpriu, embora testes e experimentos aconteçam dia após dia, envolvendo outros líderes do delivery, como a iFood. Há desafios estruturais, técnicos e logísticos à vista: os drones atuais costumam carregar poucos pacotes por vez e necessitam de pontos específicos para reabastecer. Difícil bater de frente com motos, carros e furgões. Mas a inovação nesse departamento não para. Os veículos aéreos não tripulados têm boas chances de cruzar novos ares — em tempos de guerra ou de paz.
Publicado em VEJA de 21 de Junho de 2023, edição nº 2846