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Por dentro da Loggi, o mais novo unicórnio brasileiro

Os bastidores e as estratégias da empresa, que entrou para o clube das startups avaliadas em ao menos 1 bilhão de reais

Por André Siqueira e Daniel Bergamasco
Atualizado em 5 jul 2019, 15h41 - Publicado em 5 jul 2019, 10h53
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  • Após receber o pedido pelo aplicativo de entregas Loggi no celular, o motoboy vai até o endereço marcado levar o pacote: um molho de chaves. Chegando lá, se depara com um homem trancado dentro da própria casa, a espera do chaveiro para ser libertado. O motociclista tira o capacete: ele não é um dos 25.000 cadastrados como entregadores na plataforma digital, mas o CEO do negócio, Fabien Mendez. Aos 33 anos, o dono da empresa de tecnologia gosta de experimentar na pele o cotidiano dos parceiros em “corres” pela capital paulista – e essa é uma das histórias que coleciona.

    A Loggi foi a oitava startup brasileira a se tornar um unicórnio, conforme VEJA revelou em junho. Unicórnios são empresas independentes de tecnologia que atingem valor de mercado de ao menos 1 bilhão de reais.

    Mendez nasceu na Riviera Francesa, passou uma parte de sua adolescência na Espanha e veio ao Brasil em 2010, para um intercâmbio acadêmico na Fundação Getúlio Vargas (FGV). Escolheu o Brasil como destino por considerar a nação “tolerante e aberta, que abraça o imigrante”. “E pensava no país que aparecia na capa da Economist com o Cristo Redentor decolando”.

    Ele acabou decidindo se estabelecer no Brasil e criou a Loggi em 2013 em parceria com o atual Head de Produto, Arthur Debert. A empresa começou realizando entregas expressas de documentos, mas, dois anos depois, entrou para o e-commerce. Nos últimos três anos, expandiu seu escopo de atuação para o delivery de comidas, em parceria com plataformas como Rappi e IFood.

    “Hoje, somos conhecidos pelo baú azul das motos, que é a forma como as pessoas nos veem nas ruas, mas isso é apenas a ponta do iceberg”, explica. Para ter sucesso no e-commerce, Fabien Mendez, que se inspira em Jeff Bezos (CEO da Amazon), Elon Musk (CEO da Tesla e da SpaceX) e Ray Dalio (CEO da Bridgewater), criou o que chama de “logística de ponta a ponta”.

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    Loggi
    Os fundadores da Loggi, Arthur Debert, Head de Produto, e Fabien Mendez, CEO (Antonio Milena/VEJA)

    O sistema de distribuição se estrutura da seguinte maneira: o pedido é enviado a um centro de distribuição, onde os algoritmos da plataforma da Loggi criarão “rotas otimizadas” que permitam que a entrega seja feita no menor espaço de tempo. De lá, uma frota de veículos inicia a entrega. A última etapa é uma atribuição do motoboy, chamado de motofretista. Nesta parte do processo, o motorista que estiver mais próximo do destino final realizará a entrega, algo semelhante ao que acontece no aplicativo da Uber.

    Atualmente, a empresa está presente em 36 municípios brasileiros, o que corresponde a 35% da população do país e a 70% do mercado de e-commerce nacional.

    Para alcançar essa meta, a empresa tem investido, sobretudo, na capacidade logística da empresa. “Em cada etapa desse processo, precisamos de serviços de mobile, inteligência artificial e automação”, explica Fabien.

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    A rodada de investimentos responsável por alçar a Loggi ao clube do bilhão teve a participação de SoftBank, Microsoft, GGV, Fith Wall e Velt Partners, com aporte de 150 milhões de dólares. Antes disso, o fundo japonês SoftBank já havia anunciado uma injeção de 111 milhões de dólares na empresa em outubro de 2018.

    + Em VEJA desta semana: os oito unicórnios brasileiros

    Respaldada pelos recursos financeiros, a empresa quer aumentar o número de entregas diárias dos atuais 100 mil para 5 milhões até 2022. O passo fundamental, diz Fabién, é expandir os investimentos na capacidade de processamento e aumentar o quadro de engenheiros especializados em robótica e inteligência artificial.

    A simbólica marca, no entanto, não chama a atenção de Fabien. “Ser um unicórnio, ter um certo valor, para mim, é muito mais a consequência do trabalho e do impacto que você tem. O fim, para nós, é, nos próximos dois anos, conectar 95% dos brasileiros”, disse a VEJA. “O empreendedor, de fato, não procura dinheiro. Dinheiro é justamente a consequência de uma solução elegante que beneficia a sociedade que você aporta”, acrescenta.

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    Dia a dia na empresa

    A Loggi ocupa um prédio na Alameda Santos, na região da Avenida Paulista.

    Na hora do almoço, os funcionários se dividem, basicamente, em três ambientes da empresa: uma sala com videogame, mesa de poker, pebolim e um boneco sparring para prática de boxe, chamado de Bobby; no primeiro andar, há mesas de ping-pong e de bilhar; e um espaço reservado para descanso, onde alguns tiram um cochilo em puffs ou em uma pelúcia gigante, de 1,50 metro de altura, apelidado de Loggão.

    Também não é raro encontrar pessoas usando chinelos, alpargatas, bermudas, roupas largas, ou andando de meias de um ambiente para o outro.

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    Loggi
    Ambiente informal: área de descompressão para descansar – ou trabalhar mais à vontade (Ivan Dias/VEJA)

    No terraço, com vista para a Avenida Paulista, há uma churrasqueira, que pode ser utilizada para confraternizações. Em mais de um andar, há um espaço definido como Honest Market (mercado honesto), algo em voga em startups. Nele, uma geladeira expositora com bebidas geladas e um balcão com algumas guloseimas, como chips integrais, chocolates e lanches naturais. Quem passa por ali escolhe o que vai consumir, registra as compras num leitor de código de barras e paga com cartão. Não há qualquer fiscalização.

    “Você tem que se sentir no seu escritório como você se sentiria na sua casa. Você tem que ter tesão para vir para o escritório, se sentir bem. O escritório é a extensão da sua casa”, define Fabien.

    Loggi
    Funcionário da Loggi compra produtos no “Honest Market” da empresa (Ivan Dias/VEJA)

    Motofretistas

    A empresa tem hoje aproximadamente 25.000 motofretistas cadastrados na plataforma, que realiza entregas para companhias como Dafiti, Mercado Livre e McDonald’s. O ganho mensal depende do uso do aplicativo, mas, segundo levantamento da empresa, com 4 horas em rota diariamente, o trabalhador fatura aproximadamente 3.500 reais mensais.

    A relação dos motofretistas com a marca do baú azul, aliás, foi alvo de contestações do Ministério Público do Trabalho (MPT). O órgão questiona o vínculo empregatício dos entregadores com a empresa e as longas jornadas para cobrar melhores condições de trabalho para a categoria. Fabien afirma que a Loggi teve seu “direito reconhecido” em todas as vezes em que foi convocada para prestar esclarecimentos sobre o caso.

    Motofretista da Loggi com o baú azul da empresa
    Motofretista da Loggi com o tradicional baú azul da empresa: presente em 36 cidades brasileiras (Divulgação/Loggi/.)

    “Os juízes entendem que não há subordinação”, explica. Para ele, os questionamentos ocorrem porque as leis brasileiras são antiquadas. “É completamente normal isso acontecer. As leis, por definição, são retroativas. Elas cristalizam uma situação passada e, diante disso, é muito normal que os órgãos públicos pensem ‘bom, isso é uma coisa nova e a gente não entende muito bem’. Isso é normal e faz parte de qualquer processo”, diz.

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    Ele ressalta que os motofretistas não são subordinados à Loggi, porque “eles decidem quando e quanto vão trabalhar”. A empresa afirma que apenas 1% dos entregadores cadastrados trabalham mais de oito horas por dia. “Não é um problema em escala, mas estamos pensando em padronizar [e estabelecer um teto de horas]. Como eles ganham bem por hora, quando batem uma certa remuneração, eles desligam”, afirma.

    Café da manhã com funcionários

    Todas as terças-feiras, no período da manhã, Fabien vai à copa da empresa com seu laptop e fica à disposição de todos os funcionários. A ideia, segundo ele, é conhecer seus colaboradores e incentivar o potencial criativo de cada um. “Com o passar do tempo, fico bom de números, mas péssimo com nomes”, brinca.

    “Quando começamos, em 2013, éramos dez pessoas, uma grande família. Todo mundo sabia o nome de todo mundo, mas hoje somos uma pequena cidade, com mais de 600 pessoas. Por isso, você não consegue ter essa proximidade com todos”, explica. “Não adianta dizermos que nosso funcionário pode levantar a mão, se expressar e ser ouvido, se não criarmos esse canal”, finaliza.

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