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Rede de mentiras: os perigos da Gettr, criada por ex-assessor de Trump

Plataforma se diz contra a cultura do cancelamento, mas a ideia é usá-la para que se espalhem fake news e desinformação

Por Alessandro Giannini Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 13h08 - Publicado em 20 ago 2021, 06h00

No dia 4 de julho, o senador Flávio Bolsonaro (Patriota) foi ao Twitter anunciar o lançamento da Gettr, nova rede social associada ao ex-presidente americano Donald Trump. O filho Zero Um do presidente Jair Bolsonaro acrescentou na postagem que já havia aberto uma conta em seu nome na nova plataforma. Antes de conclamar seus seguidores a acompanhá-lo, ele não se furtou a uma provocação. “Mais uma rede em defesa da liberdade”, afirmou. Coincidência ou não, um dia depois da celebração bolsonarista os registros de novos usuários falantes de português no recém-criado ambiente virtual ultrapassaram temporariamente os que se comunicavam em inglês. Segundo dados da própria empresa, depois dos Estados Unidos, o Brasil é o país com maior número de participantes: em torno de 80 000 pessoas.

Embora seja abertamente pró-­Trump, a Gettr não conta com o antigo inquilino da Casa Branca em suas fileiras. Na verdade, a nova rede social foi criada por Jason Miller, que atuou como porta-voz do ex-presidente americano. Miller é o CEO da empresa, que tem sede em Nova York. Ele foi o primeiro a dar boas-vindas a Flávio Bolsonaro em uma publicação, destacando que sua conta era uma das poucas brasileiras com selo de verificação. “É uma honra ter o Brasil representado de uma forma tão proeminente”, escreveu o executivo. Além de Flávio, o pai e o irmão Eduardo também têm perfis verificados. Não por acaso, Miller vem ao país na próxima semana. Na agenda, está previsto um encontro com os Bolsonaro.

TRUMP - Alvo: serviço dará voz a falácias como fraude na eleição americana -
TRUMP - Alvo: serviço dará voz a falácias como fraude na eleição americana – (./AFP)

Segundo o Wall Street Journal, a Gettr seria parcialmente financiada por um bilionário chinês, Guo Wengui, associado a Steve Bannon, ex-­marqueteiro de Trump e agora cotado para trabalhar na campanha de reeleição de Bolsonaro. Oriundo do mercado imobiliário de Pequim, Guo é acusado pelo governo chinês de corrupção e lavagem de dinheiro. Ele se notabilizou por espalhar fake news sobre a Covid-19 por meio da GNews, veículo que pertence ao conglomerado Guo Media, braço de comunicação de sua holding. Na nova plataforma, se identifica como Miles Guo e é bastante ativo.

Apresentada como um espaço em favor da liberdade de expressão e contra a cultura do cancelamento, a Gettr parece ser, na verdade, uma ferramenta para que se espalhem fake news, replicando a estratégia adotada pelos radicais pró-Trump. Assuntos fantasiosos como fraudes na eleição americana e vírus desenvolvidos em laboratório para acabar com o Ocidente estarão lá, e provavelmente serão levados a sério pelos usuários, dispostos a acreditar em qualquer bizarrice.

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arte Gettr

O início da Gettr foi atribulado. Entre outras ações duvidosas, foi acusada de inflar os números de novos seguidores. Além disso, sofreu invasões e a segurança de dados foi questionada. O código da plataforma também acabou sendo acessado por hackers, que revelaram características como a capacidade de eliminar itens dos trending topics. Na semana passada, sites americanos reportaram que a rede havia sido inundada por apoiadores do Estado Islâmico que estavam publicando propaganda terrorista. As polêmicas foram rebatidas pelo CEO no próprio ambiente virtual. Em nota pública, Miller disse que os extremistas islâmicos estavam apenas se vingando de Trump, que os teria varrido da face da Terra.

Com menos usuários do que Facebook (3 bilhões) e Twitter (1,3 bilhão), o Gettr necessita desesperadamente que Trump escolha a rede para amplificar seu discurso, como fazia antes de ser banido das redes sociais em razão dos ataques ao Capitólio, em 6 de janeiro. “Como um ambiente comunitário, ela terá certo nível de engajamento, mas não permitirá o conflito, como acontece, por exemplo, no Twitter”, diz Benjamin Rosenthal, professor e pesquisador da Fundação Getulio Vargas especializado em redes sociais. Não haverá confronto porque a ideia da Gettr, afinal, é atrair a turma disposta a espalhar fake news, e só. Nestes tempos conflituosos, tudo o que o mundo não precisa é mais uma plataforma com essa disposição.

Publicado em VEJA de 25 de agosto de 2021, edição nº 2752

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