Moondogs tocavam na avenida Paulista. O rock era bom, o show ainda melhor — era grátis. A plateia transbordava sob os 70 metros do vão livre do Museu de Arte de São Paulo naquele domingo de chuvas ocasionais de janeiro, verão de seis anos atrás.
A cada três músicas, intervalo e aparecia alguém falando sobre passe-livre e tarifa- zero no transporte coletivo paulistano. Inviável, diziam, explicavam “o mercado” e respondiam perguntas sobre orçamento municipal, contas públicas, subsídios estatais e o dinheiro do imposto pago por cada um dos espectadores.
A aula-show foi um êxito de jovens ativistas dos liberalismo. A revista britânica The Economist constatou: “Não é mais nicho”.
Três meses depois, no início do outono, agitavam no Facebook com um recém-nascido Movimento Brasil Livre. Se juntaram a símiles, como Revoltados On Line, e rivais, como Vem Pra Rua. Numa troupe mambembe, atravessaram a pé os mil quilômetros que separam o bairro paulistano de Pinheiros e a sede do Congresso Nacional.
Levaram a Brasília um pedido de impeachment da presidente de esquerda Dilma Rousseff — contra a vontade explícita do então líder da oposição, Aécio Neves, candidato do PSDB recém-derrotado na eleição presidencial, que manobrou para ficar solitário no protagonismo. Eles persistiram, e ajudaram a impulsionar a coalizão de forças que derrubou Dilma, no ano seguinte.
Estão de volta às ruas. Hoje, pretendem protestar nas maiores cidades contra Jair Bolsonaro.
Desta vez, clamam pelo impeachment de um presidente de direita, eleito há 34 meses na esteira do antipetismo e a bordo de uma aliança entre frações liberais e conservadoras.
Integram uma frente política, em parceria com outros movimentos (Livres e Acredito, Agora!), centrais sindicais, União Nacional dos Estudantes e uma dúzia de partidos políticos. Com planos eleitorais para 2022, PT e Psol se recusaram a participar da frente antiBolsonaro. Argumentaram com a rejeição a qualquer acordo com “golpistas” de 2015/2016. No entanto, não vetaram a participação dos seus militantes.
O êxito na organização dos protestos já é um fato, independente do tamanho das manifestações, e a razão é relevante: isolado no extremismo, Bolsonaro se derreteu no próprio tumulto.
Na sedução autoritária, jogou pela janela do Palácio do Planalto a chance de realizar com sucesso um governo liberal-conservador.
A melhor evidência, hoje, é a união de forças díspares (do MBL ao PDT; do Novo ao PCdoB) para gritar em coro nas ruas: “Fora Bolsonaro!”