Aos 36 anos, o Partido Socialista Brasileiro entrou na disputa presidencial com um candidato a vice-presidente, uma autocrítica e uma proposta de debate sobre o resgate do país de três décadas de estagnação, período em que o PSB se consolidou.
O candidato é o ex-governador paulista Geraldo Alckmin, vice na chapa de Lula, do PT, líder nas pesquisas eleitorais. Expoente da centro-direita, Alckmin é o mais novo novo integrante do coro partidário que ainda festeja entoando o sesquicentenário hino da Internacional Socialista (“Crime de rico a lei o encobre/ O Estado esmaga o oprimido/ Não há direitos para o pobre/
Ao rico tudo é permitido…”).
A autocrítica está em documento aprovado ontem, em Brasília: “A esquerda, da qual o PSB é parte, não implantou as reformas estruturais necessárias à transformação da sociedade, como as reformas política, tributária, agrária, urbana e trabalhista, e não modernizou a prática política. Pelo contrário, parte dela aderiu a formas tradicionais de realizar aliança por meio do corporativismo, do patrimonialismo, da fisiologia e da corrupção.”
Essa é a premissa do PSB para uma “autorreforma”, um conjunto de documentos com propostas para mudanças no governo, no Legislativo e no Judiciário. São ideias reunidas durante dois anos de debates internos, apresentadas para discussão na campanha presidencial.
Refletem o sentido de urgência sobre a ausência “de um projeto para o país”, disse o presidente do partido, Carlos Siqueira, ontem, no encerramento da reunião de três dias com delegados estaduais.
“Pode-se dizer o que quiser dos militares, mas eles, quando estiveram no poder, tinham um projeto para o país” — comentou. “Era diferente do nosso, mas tinham. Esses aí que estão no poder não têm projeto nenhum. Essa extrema-direita, que chegou ao poder no nosso país, é o que há de pior. Ela vem lá detrás, que foi aquela mesma que ficou contra o presidente [Ernesto] Geisel quando ele iniciou a abertura política. Quem era general [Augusto] Heleno [chefe do Gabinete de Segurança Institucional de Jair Bolsonaro]? Era um assessor do ministro [do Exército] Silvio Frota, que quis derrubar Geisel [em 1977] porque este queria abrir a porta para a democracia. Esses aí estão na mão do sistema financeiro internacional, que adora um governo fraco e sem ideias, porque as ideias que prevalecem sempre serão as ideias dele.”
No país agora idealizado pelo PSB liquida-se a visão dicotômica, há décadas sustentada pelo partido, sobre Estado e Mercado. “Não são entes opostos, mas complementares”, mas julga-se necessário um “razoável controle de capitais para administrar uma taxa de câmbio competitiva”, e indução do “fortíssimo setor bancário a financiar o desenvolvimento”. Em setores considerados estratégicos, como energia, água e saneamento, o Estado deve reinar absoluto, acha, sugerindo plena oposição às privatizações nessas áreas.
Para o PSB, a base das mudanças estaria numa ampla reforma política — “a mais urgente”. Significa adoção do parlamentarismo; implantação do voto distrital misto; mandatos de cinco anos no Poder Executivo, sem reeleição; cláusula de barreira (5%) para desempenho eleitoral dos partidos; e, introdução do sistema de referendos revogatórios (recall), no qual os eleitores ganha o poder de voltar às urnas “para revogar o mandato do eleito infiel”.
O partido propõe mudar o processo legislativo orçamentário, que começaria numa “requalificação das Comissões de Orçamento, com funcionamento permanente, mas apenas como sistematizadoras do processo orçamentário”. Seria uma tentativa de prevenção de um sistema parlamentarista contaminado por orçamento paralelo, como ocorre atualmente no presidencialismo bolsonarista.
Sugere para o Poder Judiciário ampla reestruturação: “É imperioso adotar o limite de oito anos para o exercício das funções de ministros e desembargadores de tribunais superiores e estaduais, com a adoção de novas formas, critérios técnicos, meritórios e de transparência
de assunção a essas vagas.”
Goste-se ou não das ideias do PSB, elas estimulam o debate na campanha. Os textos são longos, abrangentes e pontuados pela palavra “criatividade” — repetida 215 vezes num deles.